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segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Carta-patente do Coronel Lourenço Alves Penedo e Rocha


Projeto Dezessete e Setecentos: Documentos Raros sobre os Sertões do Ceará – Século XVIII
             
                                                                              Heitor Feitosa Macêdo
        
         No mês de outubro de 2019, fui contatado por um pesquisador chamado Michel (Mibson Michel Santiago Ramos) o qual procurava informações sobre a família Garro(s) da Câmara. Na verdade, andava ele no encalço de indivíduos que viveram no início do século XVIII no interior do Nordeste e que tiveram passagem pela capitania do Ceará.
         Michel, apesar de engenheiro, nutre grande entusiasmo pela pesquisa histórica, em especial, pela genealógica. Por certo, ele não é o único profissional liberal que sofre deste mal irremediável! Tendo eu a mesma paixão pela pesquisa, apesar de ser um advogado com banca mui modesta, resolvi tentar ajuda-lo nesta “empreitada”.
         Logo nos primeiros contatos, o dito engenheiro-genealogista me apresentou ao pesquisador Jorge Augusto Nascimento Nogueira de Sousa, carioca com sangue nordestino. Daí em diante, resolvemos abrir dos peito e escarafunchar nossos arquivos na tentativa comum de encontrar os benditos Garro(s). Frei de Jaboatão, Borges da Fonseca, Pedro Calmon, Barão de Studart e tantos outros clássicos da genealogia e da pesquisa histórica passaram pelo nosso crivo.
         Vagando pelos séculos transatos, nos deslocamos para os 1500, 1600 até esbarrar nos setecentos, sempre com muita sofreguidão de ter debaixo dos nossos olhos o tão desejado objeto de estudo. Impacientes, buscamos ajuda de algumas pessoas, contudo, as portas nos bateram nas ventas. Apesar dos percalços, procuramos as alternativas possíveis, seguindo pistas tênues, quase apagadas nas sombras do tempo.       
         Há quem não acredite na força que possui a união humana para fazer o bem! Também há céticos que duvidam da paixão pela pesquisa, e a todo esforço ou boa ideia costumam atribuir valores pecuniários, sempre receosos de possíveis prejuízos financeiros ou com pavor da possibilidade de não poderem mais ser os arautos do ineditismo documental.
         Diante da desconfiança e do individualismo, de moto próprio e as nossas próprias expensas, resolvemos disponibilizar, gratuitamente, nossos achados, verdadeiros tesouros que repousavam em arquivos distantes dos sertões onde foram produzidos.
         Assim, apresentaremos ao público parte da primeira etapa deste esforço de digitalização e transcrição paleográfica de documentos referentes aos sertões cearenses dos idos de 1700, posto que a ciência histórica, antropológica, geográfica, arqueológica e outras pouco avançaram sobre os mistérios deste período.  
         Por último, cabe explicar que o nome que batiza este projeto “Dezessete e Setecentos” é inspirado no título e letra de uma das músicas cantadas por Luiz Gonzaga, tendo sido o termo mais apropriado para resumir o contexto de tudo que foi dito acima.            

Carta-patente do Coronel Lourenço Alves Penedo e Rocha

            Lourenço Alves Penedo e Rocha era filho do comissário-geral Lourenço Alves Feitosa e da esposa deste, Antonia de Oliveira Leite.
         Seu pai era irmão do coronel Francisco Alves Feitosa e haviam eles migrado de Penedo (atualmente Alagoas, e, ao tempo, pertencente a Pernambuco) para a capitania do Ceará, no início do século XVIII. Inicialmente, alocaram-se no Arraial do Icó e, posteriormente, nos sertões dos Cariris Novos e Inhamuns. Como a maioria dos brancos da época que invadiam aqueles territórios, estavam em acirrada luta com os índios, comumente chamados de “tapuias bárbaros”.
         Em 1724, todos eles se envolveram numa guerra civil que tinha como uma de suas motivações a posse e propriedade da terra. Ressalte-se que seu pai havia cumulado o maior número de doações sesmariais em toda a capitania cearense, alcançando 23 sesmarias, isto é, fazendas imensas, origem dos latifúndios.
         Nesta guerra com os Montes, Mendes Lobato e outros, o grupo dos Feitosa sofreu algumas baixas, entre elas a do coronel Lourenço Alves Penedo e Rocha, que veio a ser morto durante um dos combates, conforme o documento inédito que publiquei na revista Itaytera nº 48 (2019, p. 63).

Dados do Documento

• carta-patente de oficial da Ordenança
• posto de coronel dos Pardos da Ribeira dos Icós e Inhamuns
• regimento do mesmo coronel
• anterior ocupante: Teodósio Nogueira
• obrigação de confirmação pelo Rei: prazo de 1 ano
• lugar onde foi concedida: Fortaleza
• data: 17 de agosto de 1721
• autoridade concedente: Salvador Alves da Silva

Transcrição Paleográfica

                         
Rezisto dapatente de Coronel dos Pardos da/ Ribeira dos Icos [duas palavras ilegíveis] de Lourenço/ ALz̓ Penedo e Rocha [fl. 01]


Salvador ALz̓. daSilva cavaleiro profeço da ordem de cris/ to cap.m Mor daCapitanya doSeara grande a cujo cargo/ esta ogoverno della per sua Mag.e q Ds g.e etc faco Saber aos q esta/ carta patente virem q por coanto esteja vago oposto de coro/ nel dos pardos da Ribeira dos icos Inhamus por ausencia/ de Theodozio Nogueira q oservia econvir [por ser dita]/ pessoa de satisfacam e meresim.to e tendo eu Respeito aq/ estes Requezitos com correm napesoa de Lourenso aLz̓. feitoza/ digo penedo eRocha pello bem q tem Servido asua mag.de/ nesta Cap.ta achandose em varias tropas q tem saido afazer/ guerra [ao gentio] barbaros com m.to Risco de vida e dyspendio/ deSua fazenda a vendo sempre com m.t vallor eobediencia/ aos Seus ofeseais em tudo oq lhe era em carregado doRial Servi/ so e por esperar delle q daqui em diante seavera damesma/ maneira e m.to como deve econfiança q faço de sua peso/ a Hey porbem de eLeger e nomear como pello prezente elejo/ e nomeio no posto de coronel dos pardos dos icos [duas palavras ilegíveis] pella/ ordem q tenho de sua mag.de com ocoal gozara detodas on/ as preminensias [zensoins] liberdades q em rezaò dodito posto lhe/ pertenserem eporesta lhe hei dado apose ejuram.to [palavra ilegível]/ confirmasaó por Sua Mag.de entermo de hum anno pello/ q ordeno atodos os ofeseais e Soldados Seus subordinados [lhe]/ [obedesam] cumpran egoardem suas ordens depalavras e/ por escrito tan pontual emteiram.te como devem e sao/ obrigados q pera firmeza da coal lhe mandei pasar apz.e/ por mim asenada e sellada com osenete de minhas Armas/ a coal se cumprira egoardara tam pontual e imteira/ m.te como nella se [constara?] e se Rezistrara nos Livros desta [palavra ilegível]/ mais a que tocar dada e passada neste Sitio da fortale/ za de nosasnhora da Sumpcaó. aos 17 de agosto deste [1721]/ Salvador Alz´ daSilva// tenha osello [fl. 02]  

(Imagens/Fonte: Biblioteca Nacional do Brasil).

2 comentários:

  1. Escreverei um longo comentário acerca desta postagem e outras mais, por obrigação moral e por senso de dever, pois, acredito que o homem deve prezar sempre por sua reputação. Abaixo, trechos da postagem acima entre aspas, seguidos dos meus comentários.

    " No mês de outubro de 2019, fui contatado por um pesquisador chamado Michel (Mibson Michel Santiago Ramos) o qual procurava informações sobre a família Garro(s) da Câmara [...] Michel, apesar de engenheiro, nutre grande entusiasmo pela pesquisa histórica, em especial, pela genealógica."

    O interesse do Mibson Michel é em adquirir passaporte português pela via judaica.

    "Assim, apresentaremos ao público parte da primeira etapa deste esforço de digitalização e transcrição paleográfica de documentos referentes aos sertões cearenses dos idos de 1700, posto que a ciência histórica, antropológica, geográfica, arqueológica e outras pouco avançaram sobre os mistérios deste período."

    Deveria ter mencionado que Marcelo Feitosa já apresentara ao público, em seu blog, a existência desses livros e dos registros citados. Me pergunto a razão do silêncio.

    "Daí em diante, resolvemos abrir dos peito e escarafunchar nossos arquivos na tentativa comum de encontrar os benditos Garro(s). Frei de Jaboatão, Borges da Fonseca, Pedro Calmon, Barão de Studart e tantos outros clássicos da genealogia e da pesquisa histórica passaram pelo nosso crivo [...] Apesar dos percalços, procuramos as alternativas possíveis, seguindo pistas tênues, quase apagadas nas sombras do tempo."

    Isto foi o que mais me incomodou. Quem ler isto, pensará que Heitor Feitosa Macêdo e Mibson Michel fizeram longas e extenuantes pesquisas em arquivos e documentos há muito esquecidos. É inverídico.

    Heitor e Mibson nem sonhariam na existência dos dois primeiros livros de registros de patentes, sesmarias, bandos etc do Ceará, se o meu antigo colega de colégio, Marcelo Feitosa, não tivesse publicado em seu blog algumas transcrições dos mesmos documentos. Tanto que Heitor veio pechinchar numa página de Facebook chamada "Guarda Nacional do Ceará" (que havia publicizado o blog de Marcelo) pelos livros. Não obtendo sucesso, partiu no mesmo dia para Fortaleza, acreditando erroneamente que estariam no Arquivo Público do Estado do Ceará.

    Estão, na realidade, no Arquivo Nacional, no Rio de Janeiro, com outros documentos antigos do Ceará, e fui quem obteve cópias digitais dos mesmos. Destes, e de outros mais, além dos que estão na Biblioteca Nacional.

    Heitor também não mencionou que muito pediu ao Marcelo Feitosa, e assim também o fez Mibson Michel, para que lhe fornecesse cópia dos livros antigos. Sem sucesso. Marcelo ainda fez a gentileza de mencionar onde poderia encontrar as informações necessárias sobre a localização dos livros, em obra de um historiador sobre as milícias do Ceará do século XVIII.

    Em resumo: Heitor e Mibson Michel não "descobriram" os livros. Outros já possuíam cópias dos mesmos, e não compartilharam pelos motivos que esclarecerei a seguir.

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  2. "Impacientes, buscamos ajuda de algumas pessoas, contudo, as portas nos bateram nas ventas."

    Sim, batemos e continuaremos a bater. Não esqueci que contribui financeiramente com o projeto de digitalização dos livros paroquiais da diocese do Iguatú, e que nem Heitor, nem padre Roserlândio e nem George Ney jamais me repassaram o material.

    Também não esqueci dos inúmeros livros antigos que digitalizei no Arquivo Público do Estado do Ceará, e que compartilhei com as mesmas pessoas mencionadas. Lembro bem de esperar duas ou três semanas para Heitor se dispor a me prestar algumas informações na coleção do Chico Augusto (deste, prefiro nem falar, para não atrair energia negativa).

    Eu, no lugar do Heitor, teria sido correto e deixaria claro que os livros foram encontrados após ele descobrir a existência dos mesmos através do blog do Marcelo Feitosa, e depois que este revelou algumas informações sobre a localização deles. Mas, não posso esperar correição de todos.

    "Diante da desconfiança e do individualismo, de moto próprio e as nossas próprias expensas, resolvemos disponibilizar, gratuitamente, nossos achados, verdadeiros tesouros que repousavam em arquivos distantes dos sertões onde foram produzidos."

    Não foram seus achados. Como expliquei acima, nem sabia da existência deles antes do Marcelo Feitosa publicar no blog dele, que por sua vez teve acesso aos livros através de mim.

    E o Heitor Feitosa não está disponibilizando de fato, a não ser por apresentar os trechos que o interessam, e da maneira como lhe convir. Se realmente quisesse disponibilizar, teria compartilhado a cópia digital dos livros com terceiros, ou ao menos mencionado na bibliografia a localização dos livros.

    Sem problema, eu farei por ele: Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, Fundo: Secretaria do Governo da Província do Ceará, Código 88-1119 (2 volumes).

    Disponibilizarei para quem quiser este material, mas, somente que o Heitor e Mibson Michel 1) reconhecerem como de fato souberam dos livros; 2) ou uma vez que tenham tido o mesmo trabalho que eu tive de gastar dinheiro e tempo para conseguir as cópias digitais dos mesmos.

    Quanto ao Mibson Michel, darei uma dica de onde ele pode achar as informações que tanto procura sobre os pais do Garros: Bahia.

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