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segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Os sonhos da Nova Província do Crato, da Província do Cariri Novo, do Estado do Araripe e do Estado do Cariri


Os sonhos da Nova Província do Crato, da Província do Cariri Novo, do Estado do Araripe e do Estado do Cariri

                                                                                                 Heitor Feitosa Macêdo

         A geografia do sertão nordestino, durante sua construção oficial, passou por diversas etapas, sendo que, desde o século XIX, discute-se a possibilidade/necessidade de se criar um espaço político-administrativo próximo à divisa dos atuais Estados da PB, CE, PE e PI, fato que perdurou até a segunda metade do século XX, com as tentativas de fundar a Nova Província do Crato, a Província do Cariri Novo, o Estado do Araripe e, ainda, o Estado do Cariri.

         No século XIX, em decorrência de acirradas disputas políticas entre os liberais e corcundas, a câmara da vila do Crato, no ano de 1828, tentou desmembrar o território do Cariri do restante do Ceará, englobando, para tanto, áreas limítrofes das províncias da Paraíba e Pernambuco.
         A estratégia consistia numa manobra dos liberais (republicanos constitucionalistas) para não perder o domínio sobre a vila cratense, pois os corcundas (monarquistas absolutistas) da vila do Jardim, sob a liderança de Joaquim Pinto Madeira e do padre Antonio Manoel de Sousa, estavam ganhando força diante do Governo Imperial.
         O padre Antonio Manoel, também apelidado de “Padre Benze Cacetes”, depois de ter conseguido uma audiência com o Imperador D. Pedro I, veio a ser nomeado Cavaleiro da Ordem de Cristo e cônego da Sé de Olinda/PE, em 1829:

Ill.mo e Ex.mo S.r
Tendo S.M. o Imperador, por Sua Imperial Resolução do 1º de Abril de 1824, tomada em Consulta da Mêza da Consciencia e Ordens, Concedido as honras de Conego da Cathedral de Olinda ao Padre Antonio Manoel de Souza, Vigario da Villa do Jardim d’eSsa Provincia, cumpre que V.Ex.cia lhe faça constar esta Graça, a fim de mandar solicitar o seu respectivo Alvará. Deus Guarde a V.Ex.cia Palacio do Rio-de-Janeiro em 3 de Outubro de 1829. Lucio Soares Teixeira de Gouvea. S.r Manoel Joaquim Pereira da Silva.

            Concomitantemente, Pinto Madeira também estava galgado vantagens que colocavam os liberais em grande desvantagem, pois, por força do Decreto de 25 de janeiro de 1828, ele passou e receber a gratificação anual de R$ 600 mil réis, e, por Aviso do Ministério da Guerra, datado de 18 de setembro do mesmo ano, veio a ser nomeado comandante das vilas do Crato e Jardim, ou seja, de todo o Cariri:

Entretanto Pinto Madeira, o criminoso, de serviços não era lícito ao ex-commandante das armas aproveitar-se, ainda quando o Ceará se estorcia nas guarras da contra-revolução, foi encarregado pelo governo geral (aviso do ministério da guerra de 18 de setembro de 1828) do commando militar das villas do Crato e Jardim, depois que o Sr. tenente-coronel Conrado se retirou da provincia! Ainda mais: por aviso de 4 de novembro do mesmo anno mandou-se n’essa qualidade abonar a Pinto Madeira a competente gratificação, tendo-se-lhe anteriormente, por decreto de 25 de janeiro de 1828, concedido, em remuneração de serviços, a pensão annual de 600$000 réis!

            Foi tentando evitar tudo isso que os vereadores cratenses se empenharam em criar uma nova província, da qual o Crato seria a capital, para que, assim, pudessem controlar as decisões políticas dessa nova circunscrição, qual seja, a Província do Cariri, pois, nas palavras de Pedro Théberge: “A 10 de julho do mesmo anno a camara do Crato endereçou uma representação ao governo, no sentido da conveniencia da creação de uma nova provincia no Cariry, com partes segregadas das de Pernambuco e Parahyba”.     
         O padre José Martiniano de Alencar, um dos mais destacados chefes do partido liberal no Brasil, natural do Crato, depois de ter participado das rebeliões independentistas e republicanas de 1817 e 1824, tornou-se monarquista, vindo a ocupar o cargo de senador do Império no ano de 1832, sendo que, em 1834, foi nomeado presidente da Província do Ceará.
         Porém, o Senador Alencar veio a ser demitido deste cargo de presidente em 1837, o que o fez partir do seu sítio Alagadiço Novo, em Messejana (Fortaleza/CE), para o Crato e, daí, seguiu para a Bahia, onde embarcou com destino à Corte do Rio de Janeiro.
         A vida política de Alencar estava intimamente ligada a sua terra natal, a região supedânea à Chapada do Araripe, entre as províncias do Ceará, Paraíba, Pernambuco e          Piauí, onde sua extensa parentela dominava léguas de terra e de gente. Era natural que ele desejasse continuar nas rédeas da política daquele ambiente que lhe era tão favorável.
         Desde o início da década de 1830, os parentes do padre José Martiniano de Alencar insistiam na criação dessa “Nova Província do Crato”, a exemplo do pedido feito por seu primo e compadre, Pedro Antunes de Alencar Rodovalho: “Carissimo C. e Am.o do C. Crato 16 de 8br.o de 1831 (...). Não se descuide de trabalhar, pa a criação da nova Prov.ca do Crato, pa só assim o Cariri será filis”.
         No ano seguinte, Rodovalho repete o pedido a José Martiniano de Alencar (senador desde o dia 2 de maio de 1832), ao mesmo tempo em que demonstra estar bastante empenhado na causa, esforçando-se para obter representações favoráveis de algumas câmaras cearenses e paraibanas:

Prezadissimo Primo e Amo do C. Crato 6 de Dzbr.o de 1832 (...). M.to me disconçola a noticia q̃ me dá de não ter tido adjutorio algũ pa a partilha desta Provincia, sendo da maior percizão a Capital ser no Crato, ps era o unico meio de prosperar este grd.e Pais. Hũ am.o prometeo-me alcançar huma reprezentação a favor da Camera de S. Mateus, e outro certificoume q̃ as duas de Pombel (sic.) e Rio do Peixe, já estão prontas pa reprezentarem o m.mo, e suponho q̃ Baturité ja reprezentou pm q̃ foi supitada em Ceará essa reprezentação.    
   
            Não demorou e Rodovalho, mais uma vez, expôs os planos para, diante da Assembleia geral Legislativa do Império (Câmara dos Deputados e Câmara do Senado), criar a “Nova Província do Crato”, revelando que, apesar do malogro eleitoral de alguns aliados, o Ibiapina (padre) havia sido eleito e, assim, unir-se-ia ao Senador Alencar:

Prezadissimo Primo e Am.o. Crato 2 de Abril de 1833. Quando estava na isperança, q̃ saisse Deputado pr esta Provincia P.e Carlos, e Franco Antonio, e igualme o nosso Amo Pererinha, pa o ajudarem a trabalhar a favor da nova Provca do Crato, ex q̃ passamos pello dissabor de sair some destes Hibiapina, q̃ se unirá a V. pa este fim, e tudo mais suponho contrário.

            Soma-se a este outro pedido, feito por mais um dos primos do Senador Alencar, desta vez, pelo padre Carlos Augusto Peixoto de Alencar, o qual, desde setembro de 1832, havia instalado no Julgado de Cabrobó/PE a Sociedade Fideral com vistas a viabilizar a “partilha da Província”, isto é, a formação do território da Província do Cariri Novo, sob o argumento de que havia falta de assistência pública nos “centros” (sertões) como educação, policiamento e rigor das autoridades devido à longa distância da capital:

Pe. José. Quixaba 30 de Abril de 1833 (...) cumpreme agora diser-lhe algũa couza, que tenho feito a bem da partilha da Provincia, q̃. imbora não aproveite, com tudo foi o que nas actuaes circonstancias pude conseguir. Tendo eu desde 7br.o do anno passado instalado neste Julgado de cabrobó, hũa sociedade com o Titulo de Fideral = Filial a de Pern.co, com as vistas de ir melhorando no q̃. me fosse possivel as nossas circonstancias, e dando principio a disabuzar o povo ignorante, e perverço sobre a Fideração, unica pedra de escandalo, q̃. prezentim.o o alvorossa, tendo já esta socied.e reprezentado ao Governo de Pern.co a necessid.e, q̃. soffremos de aulas de primeiras letras, ao menos em Cabrobó, Exú, e S. Maria, e igualm.e o disleixo, e relaxação das Auctorid.es no comprim.to dos seos deveres, lembrei eu que a Socied.e reconhecendo, q̃. todos os males nestes centros provinhão da falta de policia; p.r isso m.mo que os recursos se nos difficultava pela grd.e distancia da capital da Prov.ca, e q̃ o unico remedio p.a obviar a tantas disordens, e perturbações era a partilha do cariri novo em Prov.ca.    
            Ao tempo, Carlos Augusto estava empenhando para que o assunto chegasse ao conhecimento da Assembleia Geral e, em que pese ele já ter obtido relevante apoio para a criação da referida província, manifestou receio de o Concelho Provincial do Ceará não aceitar a tal “partilha”:

(...) e sendo unanimem.e apoiada a m.a indicação, reprezentou-se isto m.mo em Sessão ordinaria de 18 deste més aos conselhos Provinciaes de Pern.co, e Ceará, p.a que ouvindo o reclamo geral dos povos fizesse xegar ao conhecimento da Assembléa Geral a necessidade daquella partilha, sem a qual jamais deixaria de aparisser frequentes revoluções, e outros m.tos attentados, com que o genio do mal, e da pervecid.e tem feito constantem.e a nossa oppressão. Não sei se o concelho do ceará annuirá a nossa requizição, e pelo que me paresse assim o não o fará; p.r q̃. tudo q.to hé pretencente a velha comarca, opõe-se a nova partilha; com tudo nesta m.ma occazião escrevi particularm.e ao João Facundo, q̃. sem me conhecer se tem comonicado comigo, e feito-me os maiores offerecimentos, p.a q̃. como hum dos conselheiros influa, e coadjuve este negocio: o m.mo fis com o Albuquerque, que se me mostra grato pela amiz.e, que eu t.o conservado com o Torres, e como vossé t.a tão bem sahido concelheiro, e venha em 7br.o pode ainda com m.to muito maior força fazer com q̃. o conselho reprezente.

            Mas, segundo o padre Carlos Augusto, no julgado de Cabrobó, a oposição mais veemente partia de dentro da própria família Alencar, feita por um parente chamado Martinho da Costa, que, tendo sido liberal desde 1817, passou a pregar contra a Sociedade Fideral, utilizando em seus argumentos os mesmos princípios do padre Antonio Manoel de Sousa (o Padre Benze Cacetes), ou seja, que a Fideração tinha por base destruir a religião e a honestidade das famílias:

Eu podia tão bem p.r outro lado tentar outra cousa, q̃. era hũa reprezentação geral dos povos deste Julgado; mas julgo, q̃. será baldado o imprehender semelhante couza; p.r q̃. Martinho da Costa, nosso parente, e am.o, e que thé agora desde 1817 tem sido hum liberal constante, e decidido, mudou-se de rumo, e nestes centros tem feito opposição a tudo q.to hé idéa liberal, invenenando a Fideração, e todas as Socied.es, que tomão o Título de Fideraes, e athé argumentando com os m.mos principios do P.e Ant.o Manoel; isto hé, q̃. a Fideração tem p.r baze distruir a Relligião, e a honestidade das familias, e p.r conseguinte pondo-me na m.ma indisposição, e má fé p.a com os povos, hũa vés, que sou eu influente da Sociedade Fideral de cabrobó; a vista disto tenho dizistido desta pretenção, e determino esperar milhor tempo, visto q̃. Mart.o, que p.r aqui tem m.ta ascendencia se oppõe a mim, e m.mo a nova partilha do Cariri, como já a mim proprio disse, pelo q̃. elle thé então tanto se empenhava. Eu lastimo a sorte de Mart.o p.a o futuro, se elle perseverar nas m.mas idéas; pois de certo perderá a opinião publica virá a ser considerado inimigo do Brazil. Que disgrassa! hum membro da familia dos Alencares, q̃. tão Martir tem sido pela liberd.e, ser considerado hum traidor, e perder o bom nome de que sempre gozou! 

            Acrescente-se que o desejo de fundar a “Nova Província do Crato” também era compartilhado por algumas pessoas de fora da família Alencar, conforme carta datada de 19 de outubro de 1831, em que o remetente, Francisco Antonio, fala ao padre José Martiniano de Alencar sobre seu esforço para ajudar a realizar tal feito, em consulta às vilas que comporiam esse novo território, bem como sobre a resistência encontrada por parte de alguns “mandões do julgado” (do Cabrobó):

Em quanto estive no Exú fis todas as diligencias possiveis p.a a enformação das V.as, d’Assumpção, e S. M.a p.a a creação da Nova Prov.ca do Crato, mas não pude obter destas V.as, senão despotismos, e mald.es, q̃. em nada quiserão anuir, p.los Mandões daq.le Julgado, mas pensei, q̃. o Crato a m.to tinha respondido, onde tão bem influi, e fis o q̃. pude, e p.r isso não indaguei p.r esse negocio agora q.do lá fui, p.r q̃. já o julgava arranjado, e só esperava p.la decisão das Cortes, pois só deste modo hé q̃. Cariri poderá hũ dia ser felis; continuarei nessa indagação, e me prestarei p.a esse fim com todas as m.as forças, pois só nessa Esperança determinei fazer a m.a residencia naq.le lugar, q̃. com essa falta ainda está inhabitavel.
  
            Foi nesse contexto que, no dia 14 de agosto de 1839, o Senador Alencar apresentou um anteprojeto de lei que pretendia criar a Província do Cariri Novo, cujo território circundaria as províncias do CE, PB, PE e PI. Conforme já mencionado, a capital desta província seria a vila do Crato, à qual seriam anexados os territórios cearenses do Riacho do Sangue, Icó, Inhamuns, São Mateus, Lavras e Jardim. Na Paraíba, fariam parte os municípios dos sertões do Rio do Peixe e Piancó. Em Pernambuco, o município do Pajeú de Flores e os compreendidos dentro do antigo julgado de Cabrobó. Por derradeiro, também seria anexado o município de Piranhas, no Piauí.

A Assembléia Geral Legislativa decreta:
Art. 1.º ‒ Fica criada uma província que se denominará Província do Cariri Nôvo, cuja capital será a vila do Crato.
Art. 2.º ‒ Esta província se formará:
§ 1.º ‒ Dos municípios do Riacho do Sangue, Icó, Inhamum, S. Mateus, Lavras, Jardim e Crato, da província do Ceará;
§ 2.º ‒ Dos municípios do Rio do Peixe e Piancó, da província da Paraíba;
§ 3.º ‒ Do município de Pajeú das Flôres e dos compreendidos no antigo Julgado de Cabrobó, na província de Pernambuco;
§ 4.º ‒ E no município de Piranhas, da província do Piauí.
Art. 3.º ‒ As autoridades gerais, que em virtude da Constituição e das Leis existentes, houverem de ser criadas nesta nova província, terão os mesmos ordenados que têm os da província do Ceará.
Art. 4.º ‒ Logo que esta lei fôr sancionada, se tirará por sorte, na Câmara dos Deputados e no Senado, dentro os oito deputados e quatro senadores do Ceará, quatro deputados e dois senadores para representarem a nova província.
Art. 5.º ‒ Na primeira eleição geral que tiver lugar depois que esta Lei fôr sancionada, se nomearão mais dois deputados e um senador pela província, ficando ela desde então representada na Assembleia Geral por seis deputados e três senadores.
Art. 6.º ‒ A Assembléia desta nova província constará de 28 membros.
Art. 7.º ‒ Ficam revogadas tôdas as Leis e disposições em contrário.
Paço do Senado, 14 de agosto de 1839. ‒ José Martiniano de Alencar, Antônio Pedro da Costa Ferreira, José Bento Leite Ferreira de Melo, Nicolau Pereira de Campos vergueiro, Diogo Antônio Feijó, João Antônio Rodrigues de Carvalho, Francisco de Lima e Silva, Manoel Inácio de Melo e Sousa.

            Esse anteprojeto de lei foi apresentado no Senado e, durante sua tramitação, tendia a ser aprovado pelos parlamentares. Contudo, enquanto o dito procedimento legislativo se desenrolava, seu próprio autor, o Senador Alencar, desistiu de criar a Província do Cariri Novo, pois, com o Golpe da Maioridade (quando o príncipe regente ‒ Pedro II ‒, aos 14 anos de idade, assumiu o trono brasileiro), no dia 23 de julho de 1840, passou novamente à crista da política e não mais se ocupou do assunto.  
         Apesar da perda do interesse por parte do Senador Alencar, a ideia de se conceber a província do Cariri Novo perdurou. Em 1846, o então presidente (governador) do Ceará, Inácio Correia de Vasconcelos, enviou correspondência ao ministro Manuel Alves Branco requerendo a criação da referida província. Em 1854, a câmara de Barbalha também fez requerimento à Assembleia Legislativa Geral com a mesma finalidade:

1854, 18 de Julho ‒ Pediu a câmara de Barbalha, unânimemente, à “Assembleia Legislativa Geral”, “a criação de uma nova província, sendo a capital a cidade do Crato, desta província do Ceará”. Assinaram a ata Antônio Joaquim de Santana, presidente, Antônio Bezerra de Jesus, Domingos Gonçalves Parente, João Antônio de Jesus, Severino Oliveira Cabral, Antônio Policarpo de Amaral Lisboa e José Antônio de Macedo.

            No ano seguinte, o Jornal “O Araripe”, cujo redator chefe era João Brígido dos Santos, passou a advogar em favor da causa da fundação da Província do Cariri Novo. Mas este intento, apesar de não ter se concretizado nos idos dos oitocentos, reverberou até o século XX, porém, alterando-se o nome da pretensa circunscrição político-administrativa para Estado do Araripe e, depois, para Estado do Cariri.
         Já em 1940, o ministro da guerra João Segadas Viana publicou um plano para a organização do espaço político-administrativo brasileiro ao qual deu o nome de “Divisão Territorial do Brasil”. Segundo este, o País seria dividido em 27 estados e 39 territórios, sendo que no referido contexto haveria o Estado do Araripe, com fronteiras diferentes do projeto apresentado pelo Senador Alencar, mas mantendo áreas dos estados limítrofes.
         Por sua vez, o deputado estadual Wilson Roriz reacendeu a velha ideia, propondo a criação do Estado do Cariri, apresentando um novo anteprojeto de lei à Assembleia Legislativa do Ceará, no dia 21 de maio de 1957, com o seguinte teor:

Art. 1º ‒ Fica a Mesa da Assembléia Legislativa do Ceará autorizada a constituir, de acôrdo com a legislação em vigor, a Junta Plebiscitária para a consulta de que trata o art. 2º da Constituição Federal, a ser realizada na região Sul do estado do Ceará, nos municípios de Icó, Acopiara, Saboeiro, Campos Sales, Ipaumirim, Lavras, Cedro, Várzea Alegre, Cariús, Jucás, Assaré, Farias Brito, Santana do Cariri, Caririassu, Crato, Juàzeiro do Norte, Barbalha, Aurora, Barro, Milagres, Brejo Santo, Jati, Mauriti, Jardim, Porteiras, Missão Velha, Araripe, Iguatu, a fim de ser em referida região, formado o Estado do Cariri, de acordo com o art. 17, nº 16, da Constituição do Estado. 
  
            Como se percebe, a área desse Estado do Cariri, proposto por Wilson Roriz, não coincidia com a dos anteprojetos anteriores, pois ficava restrita apenas ao Ceará. Ademais, a campanha para a criação desse novo Estado consistiu no velho e popular discurso da falta de assistência do governo estadual em relação aos município interioranos, que não deixava de ser uma realidade.  
         Tão logo, em 1963, a campanha para a criação dessa unidade federativa foi retomada, desta vez, sendo encabeçada pelo advogado Raimundo de Oliveira Borges, o qual teve boa acolhida em Picos, no Piauí. À mesma época, a opinião de alguns moradores dos sertões pernambucanos de Bodocó e Exú também era favorável à criação do Estado do Cariri. Sobre este assunto, acrescenta Figueiredo Filho que:

Quando o Dr. Raimundo Borges, ilustre advogado e orador caririense, encabeçou o ressurgimento da idéia, em 1963, encontrou a melhor ressonância, em Picos, no Piauí e noutros recantos daquele estado. Certa vez, em Bodocó e Exú, no estado de Pernambuco, consultei a algumas pessoas, daquelas localidades, como receberiam elas tal empreendimento e todos foram unânimes em aplaudir. A razão principal recaia no afastamento em que viviam das realizações administrativas do govêrno estadual. Em Picos foi o mesmo motivo que conseguiu mobilizar a opinião de muita gente, em tôrno de possível adesão ao ESTADO DO CARIRI, iniciativa partida de outro estado. Tudo isso é sintomático e mostra que o interior já não mais se satisfaz em ser a parte esquecida dos govêrnos e quer agora reinvidicar os seus direitos e prerrogativas, sempre postas à parte, no passado e no presente. 

            Creio que a discussão mereça uma nova análise, posto que, de lá pra cá, a realidade assistencial do Poder Público Estadual obteve melhoras, mesmo diante da distância que separa os sertões próximos à Chapada do Araripe das suas capitais.
         Além desse critério administrativo, também é de suma importância levar-se em consideração os elementos econômicos bem como a unidade histórico-cultural existente entre a população dessa imensa área interestadual sertaneja, compreendendo diversos Estados, como CE, PB, PE, PI e RN.

(Fragmento da monografia: “Implicações da Territorialização Branca do Cariri Cearense e a Invisibilidade Indígena no atual Ordenamento Jurídico Brasileiro sob a ótica da Arqueologia Histórica-cultural”, de Heitor Feitosa Macêdo)