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segunda-feira, 7 de setembro de 2015

ARAÚJOS CHAVES & FEITOSAS COLONIZADORES DO CENTRO-OESTE DO CEARÁ HISTÓRIA E GENEALOGIA, DE F. ARAÚJO FARIAS

ARAÚJOS CHAVES & FEITOSAS COLONIZADORES DO CENTRO-OESTE DO CEARÁ HISTÓRIA E GENEALOGIA, DE F. ARAÚJO FARIAS

           
                                                                                      Heitor Feitosa Macêdo

         Fernando, é com muito prazer que traço alguns pontos acerca desta sua obra. E a sensação que tenho, ao fazer isso, seria mais ou menos a mesma que você teria se pudesse tratar desses assuntos com Seu Nado (Leonardo Feitosa) ou com Raimundo Girão, por exemplo.

         Portanto, encaro a referida tarefa com muita responsabilidade, respeito e admiração.
         Como diz o padre Neri, “historiador é como pedreiro: não pode olhar o trabalho de outro sem apontar erros”.[1] Ao lado disso, é certo que a verdade histórica nunca é absoluta, muito menos será homogênea, pois, por mais que nasça da análise de um fato externo, será sempre o produto do pensamento individual, fruto da idiossincrasia, e, portanto, relativa.
         A nós pesquisadores (já que historiador, oficialmente, passou a ser um título outorgado por universidades) consola poder escarafunchar fatos e tentar amoldá-los a uma suposta realidade de uma época pretérita, o que, dificilmente, conseguiremos fazer com exatidão.
         E o que nos move para esse deserto sem rosto é o simples desejo de saciar a universal curiosidade humana, em saber quem somos, de onde viemos e para onde vamos.
         Portanto, ao aceitar realizar tais considerações sobre o presente trabalho, não posso afastar-me da responsabilidade de tentar alcançar a verdade, repita-se, que sempre será subjetiva.
 
RESENHA

         A proposta apresentada pela dita obra alcança, perfeitamente, seu objetivo, pois o autor consegue provar que a ocupação (colonização/povoamento/fundação) do centro-oeste cearense deu-se por gente oriunda desses dois clãs originários do Rio de São Francisco, Araújo Chaves e Feitosa. Acrescente-se que estes dois grupos eram aparentados entre si, o que é demonstrado repetitiva e didaticamente no decorrer da obra.
         Talvez, para a maioria da geração moderna, o gênero destes estudos possa conotar algo supérfluo, levando os mais apressados ao erro de julgar que o estudo desses laços de parentesco seja algo dispensável, ou mero resquício do período colonial, sendo, por isso, demodé e incompatível com a atual forma de governo que vigora no Brasil, a democracia.
Data venia, esse julgamento é um erro crasso, pois o autor, ao destrinçar os nós sócio-genealógicos, não o faz com a finalidade de mero enaltecimento ou frívolo deleite, mas com a intenção de poder entender a psicologia e o arranjo social das eras passadas, tentando, honestamente, reconstituir o antigo cenário que frutificou no que somos hoje.
A importância desse estudo pode ser encontrada na proposta de um dos maiores best sellers da sociologia brasileira, Casa-Grande & Senzala, no qual Gilberto Freyre, ao analisar a formação do povo brasileiro, o faz a partir da família patriarcal, como sendo esta a célula mater dessa sociedade desde os primeiros tempos do desbravamento. Pena que a visão freiriana tenha esbarrado na zona da mata nordestina, legando aos pesquisadores do presente a difícil tarefa de investigar a atuação desse núcleo familiar no seio do sertão.
É sob essa mesma vertente que Fernando Araújo Farias lança seu olhar microscópico sobre as antigalhas dos séculos passados, estando despido da vaidade heráldica e de qualquer eugenia sertaneja. O compromisso do autor é tentar esclarecer como ocorreu a ocupação do solo no centro-oeste cearense, e qual a importância das relações familiares neste empreendimento.
         Como sempre costuma fazer em seus estudos, o autor vai além da aparente superfície imposta pela história oficial, revolvendo o passado em busca de documentos capazes de (re)contar os antigos fatos, apresentando, sempre que possível, novas versões.
É com esse mote que atesta o pioneirismo das famílias citadas nas imediações da Serra da Ibiapaba, quase que de Norte a Sul, delineando minuciosamente a ocupação luso-brasileira de parte das fronteiras do Ceará com o Piauí, na área açambarcada pelo antigo Sertão do Acaracú (hoje, modificado para Acaraú, evitando o cacófato).
Constitui um trabalho de grande fôlego, reunindo vasto conhecimento em vários campos do saber, como história, genealogia, geografia, sociologia, etc., sob uma perspectiva regional/local, onde a visão alcança aspectos microscópicos, indispensável para compreender a antiga sociedade que se alocou nessas serras e sertões.
Como afirmou o eminente padre Sadoc de Araújo: “a história do Ceará não estará escrita, enquanto escrita não estiver a história particular de cada um dos seus municípios”. Porém, essa ideia merece ser estendida, pois, na verdade, a história do sertão nordestino não estará escrita, enquanto escrita não estiver a história particular de cada um dos seus sertões.
Pensando a história desse espaço como um mosaico, pode-se dizer que a presente obra de Fernando Araújo Farias constitui mais uma das peças essenciais para a constituição desse enorme e pouco conhecido quebra-cabeça.   





[1] Feitosa, Padre Neri, Feitosas e Montes, Canindé – Ceará, p. 51.