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terça-feira, 22 de janeiro de 2013

INÉDITOS SOBRE A PARENTELA DO CORONEL FRANCISCO ALVES FEITOSA


INÉDITOS SOBRE A PARENTELA DO CORONEL FRANCISCO ALVES FEITOSA
                                                                                  
                       Heitor Feitosa Macêdo

O tempo se encarrega de revelar a verdade escamoteada pela sombra do desconhecimento, trazendo a lume enleados arqueológicos que jaziam em solo pacificado. E, desta vez, encarregou-se o presente de indigitar uma nova ordem de parentesco envolvendo o Coronel Francisco Alves Feitosa.
         Por volta de 1707, vindo de Pernambuco, chega Francisco Alves Feitosa à Capitania do Ceará. Provavelmente trazia nos alforjes provisões suficientes para suas andanças pelo sertão. Nas canastras transportava suas ferramentas de trabalho e os fatos, como eram chamadas as roupas antigamente. Metido em um gibão rompia o velame e a jurema, galgando léguas de terra seca, palmo a palmo.
         Na forma do costume, mantinha um bacamarte próximo às suas mãos, amarrado lateralmente à lua da sela. Da cintura pendia a espada, chapeada em prata, atritando na gualdrapa da gineta. Outros objetos eram metidos na algibeira, que, além das pistolas, guarnecia irrisório metal, fulvo, para remediar a falta de moeda.
         O rosto confundia-se com o chapéu de couro, atijolado, ambos vermelhos, saracoteando sob o pálio do sol. Os barbicachos já não apertavam tanto, em vista do suor despendido na longa travessia. De há muito, escanchado sobre o rocim, haviam perdido o vigor. Deste, antes tão árdego, somente escapava-lhe um galope pela força do látego e das rosetas crivadas no bucho.
         Atrás do gado caminhavam lento, pisando o rastro bífido, sob a cadência do aboio, que fazia as rezes derramarem copiosas lágrimas. Essa melopeia, vocálica e ondulante, apascentava o rebanho, dando-lhe coesão. Do contrário, as aguilhadas eram distribuídas nas persigas com os empedernidos corcéis.
         Suas mentes inculcadas com um propósito bíblico, a mesma aspiração de Moisés, vagando estoicamente em busca da terra prometida, cruzando todo o inferno para alcançar um pedaço do paraíso. Não obstante à aridez que os engoliam, vislumbraram a imponente elevação do Araripe, donde a água vertia em forma de líquido cristal.
         Era de encher os olhos aquele oásis encravado no meio do sertão, sobejando árvores portentosas e pântanos fertilíssimos, encobertos por altos jacarandás e grossas timbaúbas. Paisagem vocalizada pelo estampido do trinca ferro e uma leva de bichos canoros e sonoros. A cena ainda era coadjuvada pelo malabarismo das guaribas, os mergulhos dos tapires, as correrias das emas e alardeio das seriemas. Era o lugar perfeito para criar e procriar.
         A notícia dessa riqueza natural se propagava rapidamente, fomentando a migração de gente das Capitanias circunvizinhas, o que em breve geraria conflitos pela posse da terra, tão logo o maior empecilho fosse debelado, o índio no seu estado indômito.
         O certo é que desde o ano de 1703 essas terras já haviam sido ocupadas, porém, sem demora, o desejo em comum de apropriar-se de tais glebas provocaria turbações e esbulhos, findando em levantes sangrentos, sobremodo no ano de 1724. Tomando parte nessas sublevações, Francisco, ao lado de seu irmão (o Comissário Lourenço Alves Feitosa), guerreou por algumas décadas, até o conflito arrefecer.
         Nesse comenos, Francisco tornou-se Coronel de Infantaria da Ribeira dos Inhamuns[1] e, depois da morte do irmão, o maior possuidor de terras de toda a Capitania do Ceará[2].
Em meio à prosperidade dessas suas fazendas acabou de criar o restante dos filhos, além de contrair outros casamentos.
         Sobre os filhos de Francisco e suas esposas há, até então, o entendimento dado por Leonardo Feitosa, atualmente aceito pelos estudiosos. No entanto, em decorrência da aparição de novos documentos e outras fontes escorreitas, a hipótese conjecturada pelo citado autor, hoje, mostra-se insustentável.
         Antes, é necessário apresentar o arranjo familiar e a sequência dos esponsais do Coronel Francisco Alves Feitosa, segundo o genealogista Leonardo Feitosa[3]:

Quadro 01.

1º CASAMENTO

Coronel Francisco Alves Feitosa c/c a viúva ISABEL DE MONTES SILVA:

1- Maria c/c João Cavalcante, do Cariri;

2- Luzia c/c um filho da terceira esposa do Coronel Francisco Alves Feitosa, Isabel Maria de Melo.



Quadro 02.

2º CASAMENTO
Coronel Francisco Alves Feitosa com a viúva CATARINA CARDOSA DA ROCHA RESENDE MACRINA:
1- O Capitão Mor Pedro Alves Feitosa c/c Ana Cavalcante de Nazaré Bezerra;

2- O Coronel Manoel Ferreira Ferro c/c Bernardina Cavalcante Bezerra (irmã de Ana Cavalcante de Nazaré Bezerra);

3- Josefa Alves Feitosa c/c o Sargento Mor Francisco Ferreira Pedrosa, filho de Isabel Maria de Melo;

4- Ana Gonçalves Vieira c/c o Sargento Mor João Bezerra do Vale.










   


Quadro 03.
3º CASAMENTO
Coronel Francisco Alves Feitosa c/c a viúva ISABEL MARIA DE MELO
                                     Deste matrimônio não houve filhos


     Desta forma, Leonardo afirma que Francisco casara-se com três viúvas, na seguinte sequência: Isabel de Montes Silva (1ª); Catarina Cardosa da Rocha Resende Macrina (2ª) e Isabel Maria de Melo (3ª).
         Além disso, sustenta que Francisco gerou filhos nos dois primeiros casamentos, nascendo duas filhas no primeiro enlace (Maria e Luzia), e mais quatro filhos do segundo matrimônio (Pedro, Manoel, Josefa e Ana).
         Contudo, as pesquisas apontam que essa ordem de casamento e filiações é diferente da apresentada por Leonardo Feitosa, além de haver um acréscimo no rol dos filhos do Coronel Francisco.
         No que concerne à sequência de matrimônios, a primeira esposa de Francisco foi Catarina Cardosa da Rocha Resende Macrina, como descreve Borges da Fonseca, em Nobiliarquia Pernambucana, onde registrou as principais famílias pernambucanas da época (pesquisa realizada entre 1748 a 1777). Esta obra destaca a seguinte assertiva:

João Cavalcante de Albuquerque, que casou no sertão de Inhamuns, Capitania do Ceará, com D. Maria Alves Vieira, filha do Coronel Francisco Alves Feitosa e de sua primeira mulher Catharina.... neta por via paterna de João Alves Feitosa e de sua mulher Ana Gomes Vieira, e por via materna de N... de Menezes e de sua mulher Paula Martins
        
Disto surgem duas importantes conclusões. Inicialmente, infere-se que Catarina foi a primeira esposa de Francisco. Depois, atribui a filiação de Maria Alves Vieira à Catarina, negando a maternidade de Isabel de Montes Silva, o que é corroborado pelo seguinte documento:

Aos dezesseis dias do mês de setembro de mil setecentos e sessenta e cinco [...] em presença do Reverendo Padre José Bezerra da Costa sendo testemunhas o Reverendo Francisco Gomes Correa e o Capitão-mor Arnaud de Olanda [...] se casaram solenemente por palavras de presente Manoel Alves Feitosa natural desta Freguesia filho legítimo de João Cavalcante de Albuquerque natural de Pernambuco e de Dona Maria Vieira natural do Rio de Baixo; neto paterno de Antônio Cavalcante de Albuquerque, já defunto, natural de Pernambuco [...] com Isabel Pereira de Morais natural desta Freguesia filha Legítima de Gabriel de Morais Rego, natural da Mocha, e de Catarina Pereira de Almeida, natural desta Freguesia; neta paterna do Capitão-mor Pedro de Sousa Rego e de Maria Alves Vieira natural de Cabrobó.
        
A naturalidade de Maria Alves Vieira, Rio de Baixo, indica que Francisco e Catarina casaram-se ainda na época em que viviam no Baixo Rio São Francisco, onde já haviam constituído sua prole, conforme a indicação dos documentos arrolados ao final do texto.
         Assim, Francisco somente uniu-se à Isabel de Montes Silva em segundas núpcias, e, aparentemente, não deixou descendência com esta, como sustenta Francisco Augusto.[4] Todavia, em que pese o talento deste autor, é sensato aceitar que Luzia tenha sido filha única de Francisco e Isabel de Montes, pelo menos até que outra fonte documental venha contraditar tal hipótese.  
         Outra revelação remete à existência de um filho do Coronel Francisco, também chamado FRANCISCO ALVES FEITOSA. Antônio Bezerra[5] já havia cogitado essa filiação com base em um único documento, o que não foi suficiente para convencer os historiadores. Porém, fontes inéditas confirmam que Francisco Alves Feitosa (filho) existiu, mas falecera na juventude, durante o conflito de 1724.[6]
         Portanto, com base no exposto, o novo arranjo familiar envolvendo o Coronel Francisco Alves Feitosa apresenta-se da seguinte forma:

Quadro 04.

1º CASAMENTO
Coronel Francisco Alves Feitosa c/c a viúva CATARINA CARDOSA DA ROCHA REZENDE MACRINA
1- Francisco Alves Feitosa (homônimo do pai e morto durante os conflitos de 1724);

2- O Capitão Mor Pedro Alves Feitosa c/c Ana Cavalcante de Nazaré Bezerra;

3- O Coronel Manoel Ferreira Ferro c/c Bernardina Cavalcante Bezerra (irmã de Ana Cavalcante de Nazaré Bezerra);

4- Josefa Maria Feitosa c/c o Sargento Mor Francisco Ferreira Pedrosa;
5- Ana Gonçalves Vieira c/c o Sargento Mor João Bezerra do Vale;

6- Maria Alves Vieira c/c João Cavalcante de Albuquerque, morador nos Cariris Novos.


Quadro 05.

2º CASAMENTO
Coronel Francisco Alves Feitosa c/c a viúva ISABEL DE MONTES SILVA:
1- Luzia (?).


Quadro 06.

3º CASAMENTO
Coronel Francisco Alves Feitosa c/c a viúva ISABEL MARIA DE MELO.
                                     Deste matrimônio não houve filhos.



DOCUMENTOS QUE RELACIONAM ALGUNS FILHOS DO CORONEL FRANCISCO ALVES FEITOSA:

DOC.01:[7] “Aos vinte e seis dias do mês de junho de mil setecentos e sessenta e hum na capela de Nossa Senhora do Monte do Carmo dos Inhamuns, feitas as denunciações na forma do Sagrado Concílio Tridentino onde os contraentes são naturais e moradores, sem se descobrir impedimento algum como consta da certidão dos banhos que em meu poder ficam e estavam dispensados do parentesco em que estavam ligados como do mandado de casamento consta, de licença minha, na presença do Reverendo Coadjutor Antônio Lopes de Azevedo e das testemunhas o Coronel Francisco Alves Feitosa e o Tenente-coronel Manoel Ferreira Ferro, pessoas por mim conhecidas que presentes estavam se casaram em face da Igreja por palavras de presente José Alves Feitosa filho legítimo do Sargento-mor Francisco Ferreira Pedrosa, já defunto, e de Josefa Maria Feitosa, natural e moradora nesta Freguesia, com Maria Madalena Vieira, filha legítima do Sargento-mor João Bezerra do Vale e de Ana Gonçalves Vieira, já defunta, natural e moradora nesta Freguesia, e logo se lhes deram as bênçãos conforme os ritos e cerimônias da Santa madre Igreja, de que fiz este assento em que me assinei e as testemunhas na certidão em presença do reverendo Coadjutor Antônio Lopes de Azevedo que aos nubentes assistiu – O Padre Sebastião da Costa Machado, Cura dos Inhamuns. Francisco Alves Feitosa – Manoel Ferreira Ferro”.    

DOC.02:[8] “Aos vinte e seis de julho de mil setecentos e sessenta e três, pelas onze horas da manhã, na capela de Nossa Senhora da Conceição do Cococi, filial desta Freguesia de Nossa Senhora do Monte Carmo dos Inhamuns, feita as denunciações na forma do Sagrado Concílio Tridentino na Capela de São Mateus que as vezes faz de matriz, na capela do Cococi onde os contraentes  são naturais e moradores sem se descobrir impedimento algum sendo dispensados no segundo grau de consanguinidade pelo Exm.º e Revm.º (Visitador) como consta do mandado de casamento e certidão de banhos que em meu poder ficam, de licença minha, na presença do Reverendo Marcelino Soares da Veiga, sendo presentes por testemunhas o Coronel Francisco Alves Feitosa e José Alves (Feitosa, 1º), pessoas conhecidas e outras muitas, se casaram solenemente por palavras de presente Eufrásio Alves Feitosa, natural desta Freguesia, filho do Sargento-mor João Bezerra (do Vale), já defunto, natural de Tracunhém e de Ana Gonçalves Vieira, natural de Penedo, neto materno do Alferes Antônio Bezerra, natural de Tracunhém, ignora os avós maternos, com Josefa Vieira (Ferreira) de Barros, natural desta Freguesia, filha legítima de Antônio Pereira (do Canto), já defunto, natural de Penedo e de Antônia de Barros, natural da Mocha (fazenda Mocha, Piauí), ignora os avós e logo se lhes deram as bênçãos conforme os ritos e cerimônias da Santa Madre Igreja de que eu Cura Sebastião da Costa Machado fiz este assento quando se me foi entregue aos dezesseis de setembro do dito ano que por verdade me assinei. Sebastião da Costa Machado – José Alves Feitosa – Francisco Alves Feitosa”

DOC.03:[9] “Aos vinte e dois de fevereiro de mil setecentos e trinta e dois[10] de minha licença feitas as denunciações nesta matriz sem se descobrir impedimento como consta nos banhos e certidão o Reverendo Vigário Antônio Jorge Guerra, da Freguesia de Santo Antonio de Tracunhém, onde é natural o contraente presentes por testemunhas o Comissário Lourenço Alves Feitosa e o Capitão Antonio Barbosa Correa pessoas conhecidas se casaram solenemente por palavras de presente João Alves Bezerra natural da Freguesia de Santo Antonio de Tracunhém, Bispado de Pernambuco, filho do Alferes Antonio Bezerra e Maria Alves de Medeiros, e Ana Gonçalves Vieira natural desta Freguesia filha do Coronel Francisco Alves Feitosa e de Catarina Cardosa, já defunta, fregueses desta Freguesia, tudo constou da certidão do dito Reverendo Padre, de que fiz este assento que por verdade assinei. Antonio Barbosa Gerez – Lourenço Alves Feitosa. Antonio Barbosa Correa.”



BIBLIOGRAFIA:

Augusto, Francisco, Famílias Cearenses, Fortaleza – Ceará, Editora Premius, 2001.

Bezerra, Antônio, Algumas Origens do Ceará, Fortaleza – CE, Fundação Waldemar Alcântara, 2009.

Feitosa, Aécio, Casamentos Celebrados nas Capelas, Igrejas e Fazendas dos Inhamuns (1756 – 1801) – História da Família Feitosa, Fortaleza - Ceará, 2009.
_______A Família Feitosa nos Registros Paroquiais (1728 – 1801), Canindé – Ceará, Gráfica Canindé, 2005.

Feitosa, Leonardo, Tratado Genealógico da Família Feitosa, Fortaleza – CE, Imprensa Oficial, 1985.

Macêdo, Heitor Feitosa, O Maior Sesmeiro do Ceará por Acaso, disponível em: http://estoriasehistoria-heitor.blogspot.com.br/2010/08/o-maior-sesmeiro-do-ceara-por-acaso.html Acesso em: 23 jan. 2012.
________ DOCUMENTOS INÉDITOS: (I) CONFIRMAÇÃO DE CARTA PATENTE DO CORONEL FRANCISCO ALVES FEITOSA, disponível em: http://estoriasehistoria-heitor.blogspot.com.br/2012/04/documentos-ineditos-i-confirmacao-de.html. Acesso em 23 jan. 2012.










[1] Macêdo, Heitor Feitosa, DOCUMENTOS INÉDITOS: (I) CONFIRMAÇÃO DE CARTA PATENTE DO CORONEL FRANCISCO ALVES FEITOSA, disponível em: http://estoriasehistoria-heitor.blogspot.com.br/2012/04/documentos-ineditos-i-confirmacao-de.html. Acesso em 23 jan. 2012.
[2] Macêdo, Heitor Feitosa, O Maior Sesmeiro do Ceará por Acaso, disponível em: http://estoriasehistoria-heitor.blogspot.com.br/2010/08/o-maior-sesmeiro-do-ceara-por-acaso.html Acesso em: 23 jan. 2012.
[3] Feitosa, Leonardo, Tratado Genealógico da Família Feitosa, Fortaleza – CE, Imprensa Oficial, 1985, p. 14.
[4] Augusto, Francisco, Famílias Cearenses, Fortaleza – Ceará, Editora Premius, 2001, p.306.
[5] Bezerra, Antônio, Algumas Origens do Ceará, Fortaleza – CE, Fundação Waldemar Alcântara, 2009, p. 136 e 212.
[6] O autor do presente texto possui uma coletânea de documentos inéditos a respeito do tema e, em breve, dará publicação aos mesmos em um trabalho mais específico.
[7] Feitosa, Aécio, Casamentos Celebrados nas Capelas, Igrejas e Fazendas dos Inhamuns (1756 – 1801) – História da Família Feitosa, Fortaleza, 2009, p. 114.
[8] Ibidem, op. cit., p. 154.
[9] Ibidem, op. cit., p. 115.
[10] Convém observar que Aécio Feitosa aponta para esse casamento a data de 06/07/1763 (Casamentos Celebrados nas Capelas, Igrejas e Fazendas dos Inhamuns (1756 – 1801) – História da Família Feitosa, Fortaleza, 2009, p.115). Noutra obra, o mesmo autor diz ter ocorrido esse casamento no dia 26/02/1733 (in Feitosa, Aécio, A Família Feitosa nos Registros Paroquiais (1728 – 1801), Canindé/Ceará, Gráfica Canindé, 2005, p. 63). Ressalte-se que as duas datas apontadas são inexatas, pois os livros paroquiais do Icó registram na verdade o dia 22/02/1732 (Ver o livro de anotações do Padre Antônio Gomes de Araújo no DHDPG em Crato/CE).