Projeto
Dezessete e Setecentos: Documentos Raros sobre os Sertões do Ceará – Século
XVIII
Heitor Feitosa Macêdo
No
mês de outubro de 2019, fui contatado por um pesquisador chamado Michel (Mibson
Michel Santiago Ramos) o qual procurava informações sobre a família Garro(s) da
Câmara. Na verdade, andava ele no encalço de indivíduos que viveram no início
do século XVIII no interior do Nordeste e que tiveram passagem pela capitania
do Ceará.
Michel,
apesar de engenheiro, nutre grande entusiasmo pela pesquisa histórica, em
especial, pela genealógica. Por certo, ele não é o único profissional liberal
que sofre deste mal irremediável! Tendo eu a mesma paixão pela pesquisa, apesar
de ser um advogado com banca mui modesta, resolvi tentar ajuda-lo nesta
“empreitada”.
Logo
nos primeiros contatos, o dito engenheiro-genealogista me apresentou ao
pesquisador Jorge Augusto Nascimento Nogueira de Sousa, carioca com sangue
nordestino. Daí em diante, resolvemos abrir dos peito e escarafunchar nossos
arquivos na tentativa comum de encontrar os benditos Garro(s). Frei de
Jaboatão, Borges da Fonseca, Pedro Calmon, Barão de Studart e tantos outros
clássicos da genealogia e da pesquisa histórica passaram pelo nosso crivo.
Vagando
pelos séculos transatos, nos deslocamos para os 1500, 1600 até esbarrar nos
setecentos, sempre com muita sofreguidão de ter debaixo dos nossos olhos o tão
desejado objeto de estudo. Impacientes, procuramos ajuda de algumas pessoas,
contudo, as portas nos bateram nas ventas. Apesar dos percalços, procuramos as
alternativas possíveis, seguindo pistas tênues, quase apagadas nas sombras do
tempo.
Há
quem não acredite na força que possui a união humana para fazer o bem! Também
há céticos que duvidam da paixão pela pesquisa, e a todo esforço ou boa ideia
costumam atribuir valores pecuniários, sempre receosos de possíveis prejuízos
financeiros ou com pavor da possibilidade de não poderem mais ser os arautos do
ineditismo documental.
Diante
da desconfiança e do individualismo, de moto próprio e as nossas próprias
expensas, resolvemos disponibilizar, gratuitamente, nossos achados, verdadeiros
tesouros que repousavam em arquivos distantes dos sertões onde foram
produzidos.
Assim,
apresentaremos ao público parte da primeira etapa deste esforço de
digitalização e transcrição paleográfica de documentos referentes aos sertões
cearenses dos idos de 1700, posto que a ciência histórica, antropológica,
geográfica, arqueológica e outras pouco avançaram sobre os mistérios deste
período.
Por
último, cabe explicar que o nome que batiza este projeto “Dezessete e
Setecentos” é inspirado no título e letra de uma das músicas cantadas por Luiz
Gonzaga, tendo sido o termo mais apropriado para resumir o contexto de tudo que
foi dito acima.
Carta-patente do Capitão Cosme
Ferreira da Silva
Cosme Ferreira da Silva foi um dos
grandes latifundiários da capitania do Ceará Grande, onde obteve quatro datas
de sesmarias entre os sertões dos Inhamuns e Cariris Novos.
Peticionário
|
Localização
|
Dimensão
|
Data
|
Vol
e nº
|
Cosme
Ferreira da Silva
|
Inhamuns
|
3x1
|
06/09/1717
|
5º
- nº 359
|
idem
|
Riacho
Quintirire
|
3x1
|
28/09/1707
|
5º
- nº 246
|
idem
|
Rio
Cariús e Bastiões
|
3x1
|
02/02/1717
|
10º
- nº 49
|
idem
|
Rio
Cariús e Bastiões
|
3x1
|
31/10/1730
|
12º
- nº 13
|
Segundo o monsenhor Francisco de Assis
Couto, a atual cidade de Jucás/CE surgiu da fazenda São Mateus, a qual pertencia a
Cosme Ferreira da Silva, justamente na sesmaria que havia peticionado no ano de
1707[1].
Antonio Gomes de Freitas afirma que
Cosme era irmão do sargento-mor Francisco Ferreira Pedrosa[2]
(Ver: <http://estoriasehistoria-heitor.blogspot.com/2019/12/projetodezessete-e-setecentos_50.html>),
o qual, por sua vez, era filho de Cosme Ferreira da Silva e Albuquerque,
descendente de Antonio Cavalcante de Albuquerque[3].
De acordo com o Monsenhor Couto, a
esposa de Cosme Ferreira da Silva era Isabel Ferreira da Silva. Contudo,
Antonio Gomes de Freitas considera que ela se chamava Isabel Maria de Melo e
que, depois de viúva, teria casado com o coronel Francisco Alves Feitosa[4].
Dados do Documento
•
carta-patente de oficial da Ordenança
•
posto de Capitão da Companhia dos Reformados do Quixelô e Inhamuns
•
posto ocupado anteriormente: não foi dito
•
regimento: não foi dito
•
anterior ocupante: não foi dito
•
obrigação de confirmação pelo governador de PE: prazo de 6 meses
•
lugar onde foi concedida: Icó (Arraial de Nossa Senhora do Ó)
•
data: 1º de julho de 1719
•
autoridade concedente: capitão-mor do CE Salvador Alves da Silva
Transcrição Paleográfica
Rezisto
dapatente doCap.m dos
Reformados/ Cosme Frr.a daSylva.
Salvador Salvador Alz. Da Sylva
Cavaleiro profeço daordem denosso/ Snor̓. JEsus christo cap.m Mayor
daCapitania doCearà g.de aCujo/ cargo està o governo della por Sua
Mag.de q Deos g.de etta Faço sa/ ber aos q esta Carta
patente virem que por quanto Seacha va-/ go oposto deCap.m daComp.a dos Reformados do Quixalo, e
Inhamu/ e Comvir provello empecoa deSatisfacao emiricimentos tendo/ eu
Respeito aq todos estes Requezitos ConcoRem napeçoa de-/ Cosme Frr.a da Sylva [este?] por ser hum dos hómenis nobres/ desta Capitania como pello
bem q tem Servido aSua Mag.e q/ Deos g.e nesta mesma
Capitania nas ocaziois q se lhe tem ofe-/ recido aServ.co dod.o
Snor̓ acompanhando as tropas q tem sa [fl.
01]
Sahido
afazer guerra ao Gentio Barbaro Levantado, e-/ hindo alguas vezes por cabo nas
mesmas tropas com Risco devi-/ da, edespendio deSua fazenda, nas quais oCaziois
[se?] ouve sempre/ com muyto grande
vallor, ezello doRial Serv.co [mutilado]
esperar delle/ q daqui emdiante Sehaverà [mutilado
e permeado de tinta] como deve/ eConfiança q faço de Sua pecoa, epella nova
ordem q tenho de Sua/ Mag.e em carta de dezassete deDezbr.o
de mil e SeteCentos equinze/ naq.l medà faculdade p.a
poder provir todos ospostos das ordenan-/ cas militares desta Capitania, Hey
por bem deoeleger enomear (Co-/ mo pella prezente elejo enomeyo) noposto deCap.m daComp.a
dos Refor/ mados da Ribr.a doQuixelo, e Inhamús, com oq gozarà
de todas as on-/ Ras, graças, franquezas, Liberdades, privilegios
preheminencias/ eexençois q em Razaò dod.o posto lhe pertensserem,
doq.l poderà den-/ tro de
seis mezes Requerer aConfirmaçaó, p.lo gov.or de Pern.co
e por esta/ [Hey] dado aposse ejuram.to pello q ordeno aos off.s
Soldados Seus/ Subordinados conheçaó ao d.o Cosme Frr.a da Sylva pello tal/ Cap.m eo
onRem estimem, elheobedeçaó, cumpraó e goardem Sua/ ordenis tanto depalavra,
Como por escrito, tam pontual e/ inteiram.te como devem, eSam
obrigados ep.a firmeza de tudo/ lhemandey paçar aprez.te
por mim aSignada eCellada com o-/ Signete de minhas armas aq.l Se
rezistara nos Livros da Secret.a/ deste Governo, enos mais que
tocar. Dada neste aRayal denossa/ Sr.a
do Ho̓ no pr.o do mês de
Julho, eeu Manoel de Miranda afis/ anno
de mil esete Centos edezanove. Salvador Alz´ da Sylva/ estava oCello. [fl. 02]
(Imagens/Fonte: Biblioteca Nacional do Brasil).
[1] COUTO, Mons. Francisco de Assis.
Origens de São Mateus: sua formação
sócio-eclesiástica. Crato: Empresa Gráfica LTDA, 1965, p. 17.
[2] FREITAS, Antônio Gomes de. Inhamuns: Terra e Homens. Fortaleza/CE:
Editora Henriqueta Galeno, 1972, p. 91 e 162.
[3] Anotações de Antonio Gomes de
Freitas. Disponível em: < https://institutoculturaldocariri.com.br/wp-content/uploads/2018/09/Colecao-Antonio-gomes-de-Freitas_Novo-Documento-2018-08-22-2_1-merged.pdf>.
Acesso em 21 de dez. 2019, às 11h26min.
[4]
FREITAS, Antônio Gomes de. Notas e Transcrições: Vários Artigos. Revista
do Instituto do Ceará: Fortaleza: 1966, p. 279.