Páginas

domingo, 20 de fevereiro de 2011

BIMBIM FEITOSA: CORAGEM NO ALTO JAGUARIBE


                                                                                 Heitor Feitosa Macêdo

Salústio Ferrer Feitosa (Bimbim ou Bimba), nasceu nas cabeceiras do Rio Juaguaribe, na fazenda Saco Virgem, aos pés da Serra Grande. Seus pais eram o Tenente Emilano Ferreira Ferro e Epifânia Estefânia Bandeira Ferrer, moradores na região dos Inhamuns, no atual município de Parambu.
Vagiu em 1891 , sendo o sétimo dos dez filhos de Mãe Fana e Pai Milú, pois o oitavo era o ilustre Monsenhor Francisco de Assis Feitosa. Apesar disso, o gênio de Salústio mais se assemelhava ao do irmão primogênito, Epaminondas Ferreira Ferro, pouco afeito ao mister religioso, e mais habituado à lida no rude sertão.
Possuía um gênio intempestivo. Passando ao largo da perversidade, agia combativamente nas questões que possuísse a melhor razão, sem exceder ao bom senso da época. Suas pelejas foram intensas e dignas de narração, constituindo-se em lendárias bravuras nos agrestes dos Inhamuns.
Sendo filho de um clã exclusivamente pastoril, fez-se afamado pela habilidade com que traquejava o gado, ostentando a galhardia de ser renomado vaqueiro. Conta-se que ele costumava domar animais bravios, e numa dessas ocasiões, ao montar um cavalo não manso, no pátio da fazenda, esporeava-o incessantemente, cuidando para não ser lançado ao chão pelo selvático equino. No entanto, o solo daquele terreiro era repleto de buracos feitos por gambás. Assim, a alimária findou metendo uma das patas em um desses orifícios, vindo a espojar-se bruscamente. Contudo, o semovente esbarrou com o dorso solitário no chão, pois Bimbim já havia saltado do lombo daquela montaria, tal qual um gato, posto que caiu em pé.
Também não escusava-se de ir ao encalço de cangaceiros, que fervilhavam os sertões de outrora, como ocorrera em 1914, quando Dr. Floro Bartolomeu, movido por tricas políticas, contratou Vicente Silvino (irmão do célebre cangaceiro Antônio Silvino) para matar o Coronel Lourenço Alves Feitosa e Castro. Depois da tentativa frustrada do assassínio, o bandido escapuliu pelo sertão, cabendo a vários grupos persegui-lo. Dentre estes, foi chefe Bimbim, juntamente com seu irmão Epaminondas.
Certa feita, ao comparecer nas festividades do casamento de um primo, Salústio viu-se obrigado a intermediar uma situação que constrangia o noivo, Zé Daniel, que tivera uma desinteligência com uns “negros” conhecidos pela alcunha de Jaós. Estes haviam sido manipulados pela família Gomes de Freitas, que na época disputava o poder político com os Feitosas. E por meio de provocações, buscavam desencadear reações adversas ao bom convívio.
Bimbim, resolveu ir até a fazenda de seu parente, onde o casamento era comemorado, apesar de sua cunhada, Mariquinha, esposa de seu irmão Epaminondas, tê-lo admoestado para que não fosse, visto que os Gomes de Freitas estavam promovendo perseguições aos seus adversários, e Epaminondas encontrava-se ausente. Mesmo assim Bimbim teimou, e foi confraternizar-se na residência de seu primo Zé Daniel.
Ao chegar a residência em que se rejubilavam os convivas e os nubentes, foi informado da desagradável presença dos Jaós, imiscuídos por entre os convidados, sem a aquiescência dos noivos. Sem muita delonga, e investido de pragmática e eloquente persuasão, Bimbim chama os Jaós para um particular, e pergunta-lhes se já haviam jantado, sendo a resposta afirmativa. Então, Bimbim aconselha-os a não permanecer naquele recinto, pois alegava ser inconveniente tal presença, posto que o noivo não estava satisfeito com a visita inoportuna dos seus desafetos.
Os irmãos Jaós prontamente dispuseram-se a deixar o recinto sem a menor resistência, no que foram acompanhados, em sua saída, por Bimbim. Este palestrava com o que seguia mais à frente, enquanto o segundo palmilhava mais atrás. Assim, deslocaram-se em direção ao breu que cercava o perímetro mais afastado da casa da fazenda, ausentando-se à luz da fogueira que clareava o terreiro. Quando tudo perecia correr calmamente, um dos irmãos apunhala Bimbim pelas costas, atravessando-o com férreo instrumento, na região do tórax, de fora a fora. Igual punhalada deu-a o outro irmão, só que frontalmente. Mas, Bimbim reagira no instante que fora agredido pelo primeiro, sacando a arma, disparou certeiro contra o indivíduo que pusera-se em sua frente, o qual tombou agonizante. A vítima das facadas, também veio ao chão, mas antes de cair, ergueu o braço para trás instintivamente, disparando outro tiro.
Ao ser socorrido, Bimbim encontrava-se bastante ferido, com quatro chagas, pois cada punhalada abrira duas feridas, de um lado e outro de seu corpo, trespassando-o. Mesmo assim recobrou as forças para narrar o que se passara com ele. De pronto, depararam-se, a poucos metros de onde estava deitado Bimbim, com o cadáver do Jaó que o cutilara frontalmente, mas não encontraram o segundo agressor, embora o moribundo afirmasse ter atirado em direção à retaguarda, sem a certeza de ter atingido seu alvo.
Enquanto sua tia Salustina, irmã de Epifânia, prestava-lhe os cuidados realizando a assepsia dos ferimentos, ele ria, ao mesmo tempo que bolhas emergiam das profundas úlceras, fato indicativo de que o pulmão, ou outra parte do sistema respiratório, estava atingido. Então, sua tia perguntou-lhe o porquê do riso diante de tamanho horror, e ele a respondeu que ria por doer muito.
Sem demora, Pedro Alves Feitosa e Vale, tio paterno de Bimbim e esposo de Salustina, vai ao encontro do sobrinho, e ao chegar ao local é informado do periclitante estado de saúde da vítima. Nesse instante, propala a ordem aos seus, que, “se Bimbim morrer, na casa dos jaós não é pra ficar vivo nem galinha”.
Na mesma noite os homens saem à caçada, fazendo-se acompanharem de rastejadores e armamento suficiente a evitar outro ataque á sorrelfa. Destarte, seguem na madrugada pelas brenhas, metendo-se por baixo das frondosas árvores do cerrado, nas faldas da Serra Grande, cuidando para não serem surpreendidos por cima, e desviando-se dos espinhos que a caatinga circunvizinha camuflava na escuridão. Mas, antes de raiar o dia, no curso de um riacho, são vistas nódoas de sangue. Os homens seguem, e mais a frente encontram o derradeiro Jaó, agônico, esvaindo-se em sangue por conta de uma bala que o atingira na coxa. Finda morrendo em consequência daquele tiro disparado a esmo por Bimbim.
Infelizmente, depois de convalescido, Salústio Ferrer Feitosa (Feitosa Ferro) termina sendo acusado de um crime. Por certo não era menos culpado do que seus inimigos, pois em tempos que a força era a regra, os situacionistas o encaravam como exceção, e dolosamente imputam-lhe a culpa de certo delito. Para evitar a pecha de um injusto cárcere, Bimbim vai residir no vizinho estado do Piauí, onde casou-se. Contudo, faleceu prematuramente de infarte do miocárdio, quando viajava a cavalo. Logo após sua viúva enlouquece, ainda grávida do finado marido, morre em estado puerperal, antes de dar à luz.









BIBLIOGRAFIA:

Feitosa, Leonardo, Tratado Genealógico da Família Feitosa, Fortaleza, Imprensa Oficial, 1985.

Freitas, Antônio Gomes de Freitas, Inhamuns: Terra e Homens, Fortaleza, Editora Henriqueta Galeno, 1972.
______ Revista do Instituto do Ceará, 1972

SITES:

http://www.familysearch.org/eng/default.asp

ENTREVISTADOS:

Manoel Feitosa Sousa