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sábado, 23 de novembro de 2019

Primeira Carta-Patente Concedida no Cariri Cearense



Primeira Carta-Patente Concedida no Cariri Cearense

                                                                                  Heitor Feitosa Macêdo

         Para ser pesquisador não precisa de título. Graças a Deus essa atividade ainda não se tornou propriedade privada dos medalhões da ciência moderna e, apesar do receio da nobreza científica, os autodidatas nos brindam com boa parte das melhores (re)descobertas do passado, a exemplo do cearense Antônio Bezerra de Menezes (1841-1921), um dos maiores pesquisadores do seu tempo.
         Entre tantas redescobertas, ele afirmou em seu livro “Algumas Origens do Ceará”, de 1918, que a primeira carta-patente a ser expedida para a ‘Ribeira do Cariri”, isto é, o Cariri cearense (região ao sul do Estado do Ceará), foi do dia 22 de junho de 1718, em favor de Manoel Soares de Oliveira.
         Recentemente, tive acesso a este documento, que repousa em lugar distante do Ceará. Esta carta-patente nomeia Manoel como “Capitão dos Assaltos”, pois, ao tempo, os índios ainda faziam resistência armada no sertão do Cariri/CE bem como no sertão vizinho de Piranhas/PB, por isso, necessitando de oficiais das Ordenanças para dar combate aos “tapuias bárbaros”.
         Outra revelação interessante remete à forma como tais índios combatiam, divididos em vários grupos, o que dificultava sua aniquilação completa. Aliás, essa estratégia bélica também foi narrada por outras pessoas contemporâneas às guerras brasílicas. Quer queira, quer não, tal logística, mais tarde, influenciou o que veio a ser chamado de cangaço.
         A seguir, paleografei a referida carta-patente. Boa leitura!


Registo da Patente de Cap.am dos ASaltos/ de toda esta Cap.nia do Siara Gr.de, Manoel/ Soares de Oliveira.
Manoel da fonseca Jayme Cap Mayor da Cap.nia do Siara Gr.de [mutilado]/ da fortaleza de N.S.ra da ASumpçaõ, p Sua Mag.de q Deus G.e etc./ Faço saber aos que esta Carta Patente virem que p. q. nas guer... [mutilado]/ ...ectivas nesta Cap.nia com O Gentio, Se tem Dividido em varios/ Ranchos, p.a mais prontos fazerem algúns Latrocinios:, me foy neSeS/ [palavra ilegível] o Posto de Cap.am dos ASaltos p.a com mais Brevid.e os [ilegível]/ [ilegível] Cabar, e Castigar, este Gentio, e evitar Mayores despezas [ilegível]/ Convir provello em PeSôa de Satisfação; Serviços, e Merecim.to, tendo/ [Eu?] Respeyto aque todos estes Requezitos, Concorrem nade Manoel/ Soares deOliv.ra, pello bem que tem Servido aSua Mag.de q De... [mutilado]/ Sertão dos Cariris, e Piranhas, fazendo entradas ao Gentio bar/ baro, q infestava aquelles Sertoins, Matando e destruhindo [os?] Mo/ radores, eoutras hostilidades, em q o d.o Manoel Soares deoLyv.ra [mutilado]/ [mutilado] mto vallor, e Risco de Sua vida, e p. esperar delle que daqui/ emdiante se havera da Mesma Maneyra, e muito Como Deve/ a Confiança que faço do Seu Procedimento. Hey por bem de eleger/ e nomear Como pella prezente elejo, e nomeyo no Posto de Cap.am/ dos ASaltos, desta Capitania, p.a q Como tal o seja, uze, exerça/ e goze de todas as honras, Graças, franquezas, izençoens Previlegios/ e liberdades, q em rezão do d.o Posto lhetocarem, do Coal poderâ dentro/ em seis mezes Requerer aConfirmação, Pelloq Ordeno a todos os officiais May/ ores e menores, Soldados e mais Pesoas, q oConheaõ p tal Cap.am/ e lhe obedeçaõ Cumpraõ, e Goardem suas ordens, tanto de Palavra/ como p escripto, tão Pontual eInteyra Mente como Devem e Saõ/ obrigados, q pa firmeza daq.l lhe mandey paSar a prez.te por mim aSignada/ e Sellada com oSignete de minhas armas, aql se Registara nos Loz da Secreta/ ria deste Gv.no, e nos mais aq tocar, Dada e paSada nesta fortaleza de N.S.ra/ da aSumpsaõ, aos vinte e dois dias do mes de junho, o Secretr.o Manoel Homem da Silva fez Anno demil e Sete Sentos edezoyto, estava O Sello/ Manoel da Fonseca Jayme [mutilado e ilegível].          

(Imagens/Fonte: Biblioteca Nacional do Brasil).






quinta-feira, 14 de novembro de 2019

A Igreja de Nossa Senhora das Dores, no Juazeiro do Norte/CE, não foi construída no ano de 1827!





A Igreja de Nossa Senhora das Dores, no Juazeiro do Norte/CE não foi construída no ano de 1827!
                      
                                                                  Heitor Feitosa Macêdo

         De acordo com alguns pesquisadores, a capela de Nossa Senhora das Dores, no município de Juazeiro do Norte, foi edificada no ano de 1827 por ordem de seu capelão padre Pedro Ribeiro da Silva Monteiro. Contudo, a leitura de um documento inédito, oriundo do arquivo da Câmara da Vila do Crato, põe essa afirmação em dúvida, conforme veremos a seguir.
Igreja de Nossa Senhora das Dores, Juazeiro do Norte/CE

         O Juazeiro do Norte é um município localizado ao sul do Estado do Ceará, na região conhecida por Cariri, tendo se emancipado do território do município do Crato no ano de 1911. Sua criação se deu por força da lei nº 1.028, de 22 de julho, enquanto que sua inauguração só ocorreu no dia 4 de outubro do referido ano[1]. Cabe destacar que seu primeiro prefeito foi o cratense padre Cícero Romão Batista.

1- O Fundador da Capela de Nossa Senhora das Dores

            Na primeira metade do século XIX, antes mesmo do padre Cícero nascer, o Juazeiro era apenas uma fazenda pertencente ao padre Pedro Ribeiro da Silva Monteiro, neto do célebre brigadeiro Leandro Bezerra Monteiro, ancestral da família Bezerra de Menezes que, atualmente, administra o referido município.
         Nesta sua fazenda Juazeiro, o padre Pedro Ribeiro construiu uma casa grande de taipa e telha, além de um engenho de cana-de-açúcar, onde, daí, administrava suas outras propriedades: Boca das Cobras, Mata, sítio Prazeres, sítio Currais de Baixo bem como duas casas de tijolo na vila do Crato, no atual quadro da Matriz[2]. 
Paisagem imaginária da povoação do Juazeiro no início do século XIX. Desenho a lápis do artista cratense Geraldo Benigno

         O padre Pedro Ribeiro presenciou turbulentos episódios políticos da vila cratense, como a Revolução de 1817; a votação da Constituinte de 1821; a Guerra de Independência de 1822; a Confederação do Equador, de 1824 e a Guerra de Pinto Madeira. Ocorre que o padre Ribeiro faleceu prematuramente, com quarenta e poucos anos, no dia 9 de setembro de 1833, deixando em testamento todos os bens para o referido avô.
         Ocorre que, em 20 de julho de 1837, o brigadeiro Leandro Bezerra, em testamento, declarou que seu desejo era ser enterrado na “Capela da Povoação do Juazeiro”, ou seja, presume-se que, nesta data, a capela de Nossa Senhora das Dores já existia. Mas quando ela teria sido edificada?    

2- O Início da Construção da Capela de N. S. das Dores   

            Sobre o início da construção da Capela de Nossa Senhora das Dores, no município de Juazeiro do Norte, parece não existir unanimidade entre os pesquisadores, pois, além de várias datas serem apontadas, este evento também é confundido com o ato de inauguração, conforme será visto. 
         O renomado historiador Raimundo Girão, em sua obra “Os Municípios Cearenses e seus Distritos”, indica, peremptoriamente, que a Capela de Nossa Senhora das Dores teria sido edificada pelo padre Pedro Ribeiro da Silva no ano de 1827:

Em 1827, pelo Padre Pedro Ribeiro da Silva Monteiro foi edificada, à sua custa, uma pequena capela no lugar denominado Tabuleiro Grande do seu sítio Taboleiro, em frente a um frondoso juazeiro, na estrada real que ligava Crato a Missão Velha, à margem direita do rio Batateira.[3]

            Já Irineu Pinheiro (1881-1954), aparentemente, o primeiro a se aprofundar mais sobre no assunto, conseguiu trazer a lume uma data precisa para o início da construção da Capela de Nossa Senhora das Dores, qual seja, o dia 15 de setembro de 1827.

Igreja de Nossa Senhora das Dores, Juazeiro do Norte/CE

         Essa data foi por ele encontrada no jornal Sul do Ceará, em edição de 16 de abril de 1905, na qual o senhor José Joaquim de Maria Lôbo sustenta que, neste dia (15 de setembro de 1827), foi lançada a pedra fundamental da dita capela:

Em registro exarado pelo Ten-Cel. José Joaquim de Maria Lôbo, rábula, professor primário e jornalista, lê-se que “em 15 de setembro de 1827, houve missa cantada na casa de Oração pelo Padre Pedro Ribeiro Monteiro, assistida pelo Padre Joaquim Lima Verde, que cantou a Epístola, acolitado pelos seminaristas Antônio Pereira de Oliveira e José Alexandre Correia Arnaud, mais tarde aquele, Vigário de Lavras da Mangabeira e este de Cabrobó, assistindo ao ato o avô do celebrante, o Brigadeiro Leandro Bezerra Monteiro, e seus filhos, coronel Gonçalo Luís Teles de Menezes, Capitão-mor Joaquim Antônio Bezerra de Menezes, Capitão José Geraldo Bezerra, capitão Manuel Leandro Bezerra de Menezes, inclusive o menor Pedro Lôbo de Menezes, também sobrinho do Brigadeiro (...).[4]

            Na mesma fonte se abebera o pesquisador Joaryvar Macedo, vindo, por conseguinte, a consignar que a construção da capela de Nossa Senhora das Dores teve início no dia 15 de setembro de 1827:

Transferindo-se, posteriormente, para o Sítio Juazeiro, que transformou em “central administrativa de outros próprios”, exatamente nesse novo habitat principiou, em 1827, a edificação da Capela de Nossa Senhora das Dores, lançando, assim, os fundamentos da atual metrópole do Cariri. [5]    
     
            A pesquisadora Amélia Xavier também se apoia nessa informação prospectada por Irineu Pinheiro. Segundo ela, o padre Pedro Ribeiro de “Carvalho” (filho de D. Luiza Bezerra de Menezes e do sargento-mor Sebastião de Carvalho Andrade), depois de ordenado e residindo na fazenda que havia pertencido ao avô, Leandro Bezerra, resolveu ir a Pernambuco requerer licença para a construção da capela em questão:

A CAPELA DE NOSSA SENHORA DAS DORES: - Ordenara-se Sacerdote o Pe. Pedro Ribeiro de Carvalho, neto do Brigadeiro porque filho de sua primogênita, Luiza Bezerra de Menezes e de seu primeiro marido, o Sargento-mor Sebastião de Carvalho Andrade, natural de Pernambuco. Para que o Padre pudesse celebrar diariamente sem lhe ser necessário ir a Crato, Barbalha ou Missão Velha, a família combinou com o novel sacerdote a ereção de uma Capelinha, no ponto principal da Fazenda perto da casa já existente. Dirigiram-se ao Senhor Bispo de Olinda e obtida a licença iniciaram a construção. Demos a palavra ao Dr. Irineu Pinheiro que publicou em seu livro “Efemérides do Cariri” o seguinte (...).[6] 

            Em seguida, Amália repete as palavras de Irineu Pinheiro, conforme a citação acima transcrita, ou seja, diz que o início das obras da capela se deu no dia 15 de setembro de 1827.
         Diante da situação, fui tentar localizar o jornal Sul do Ceará, que serviu de fonte a Irineu Pinheiro, primeiro presidente do Instituto Cultural do Cariri (ICC), com sede no Crato. No dia 6 de novembro de 2019, minha administração como presidente deste instituto havia chegado ao fim, contudo, já havia digitalizado toda a coleção da revista Itaytera e firmado contrato com o senhor Reginaldo Zurlo para a digitalização também jornais do início do século XX, pertencentes ao arquivo da dita instituição.

Jornal Sul do Ceará, p. 01

         Felizmente, no caótico arquivo do ICC ainda se encontra o jornal Sul do Ceará, bastante deteriorado e sem condições de manuseio, necessitando, urgentemente, de restauro. O que mais me dói é saber que, apesar de eu ter procurado ajuda perante IPHAN e outras instituições, ninguém pôde ajudar. Deus queira que este procedimento de digitalização chegue ao fim, pois, caso contrário, boa parte das fontes históricas sobre o Cariri desaparecerão para sempre!
         O fato é que, no dia de ontem, 17 de novembro do referido ano, encontrei as frágeis páginas do hebdomadário quase que aos frangalhos. Com muito cuidado, digitalizei pessoalmente a edição do dia 16 de abril de 1905, a qual cita a data do início da fundação da Capela de Nossa Senhora das Dores.
         O exemplar que encontrei, ano V, número 9, indica  José Esmeraldo Sobrinho como chefe-redator, sendo que a sede desta redação localizava-se na Rua do Comércio, na cidade do Crato. Na página 2, encontra-se, sob o título “Secção Livre”, uma matéria denominada “A Verdade”, assinada pelo já citado José Joaquim de Maria Lobo e com data de 19 de março de 1905, escrita no Juazeiro do Norte.

Jornal Sul do Ceará, p. 02

         No parágrafo nono, depois de fazer uma longa prédica firmado em princípios bíblicos, José Joaquim se contrapõe à opinião de um “articulista” (autor de artigos de jornal) que havia indicado 1829 como sendo o ano da fundação da Capela de Nossa Senhora das Dores.

Affirma o articulista ter sido fundada a Capella de N. S. das Dores no Joazeiro em 1829. Não é exacto; foi sentada a pedra principal a 15 de Setembro de 1827, havendo Missa cantada na casa de Oração pelo Padre Pedro Ribeiro Monteiro, assistida pelo Padre Joaquim Lima Verde, que cantou a Epistola, acolythado pelos siminaristas Antonio Pereira d’Oliveira Alencar José Alexandre Correia Arnaut, mais tarde aquelle Vigario de Lavras de Mangabeira, e este de Cabrobó, assistindo o acto o avô do celebrante, o Brigadeiro Leandro Bizerra Monteiro e seus filhos, Coronel Gonçalo Luiz Telles de Meneses, Capitão mór Joaquim Antonio Bezerra, Capitão José Geraldo Bezerra, e Capitão Manoel Leandro Bezerra de Menezes; inclusive o menor Pedro Lobo de Menezes tambem sobrinho do Brigadeiro, conhecido não só pela patente de Capitão como por ter dado de uma ves dez contos de réis ao Rm.o Ibiapina para construção da Casa de Caridade de Barbalha, afóra numeroso concurso de cavalheiros e senhoras.[7]   

            O termo “sentar a pedra principal” equivale a “lançar a pedra fundamental ou a pedra angular”, que, trocando em miúdos, significa iniciar, solenemente, a construção de uma obra. Ou seja, José Joaquim revela que, em 15 de setembro de 1827, a Capela de Nossa Senhora das Dores não existia, porém, foi o dia em que se tornou pública e oficial a decisão do seu soerguimento.  É lamentável que o informante não indique a fonte que serviu para embasar tal narrativa. Teria sido uma ata? José Joaquim presenciou o ato ou apenas recebeu esta informação diretamente da narrativa oral? O fato é que a data mencionada (15 de setembro de 1827) tem prevalecido em relação as demais.
         Portanto, como se percebe, ao longo do tempo, as opiniões sobre a data de início da construção da capela bem como sobre a época em que ela teria ficado pronta não são uníssonas. Conforme exposto, Raimundo Girão assevera que a capela em comento foi construída em 1827; Irineu, seguido por Joaryvar Macedo e Amália Xavier, respalda-se no depoimento de José Joaquim de Maria Lobo, o qual indica 15 de setembro de 1827 como marco para o início da edificação; enquanto o "articulista" do jornal Sul do Ceará já havia registrado 1829 como sendo o exato ano da fundação da Capela de Nossa Senhora das Dores.
         Diante das preciosas informações oferecidas, inclusive, por autores tão consagrados na historiografia cearense, seria incoerente tentar revolver a superfície deste objeto. Contudo, os livros da então Vila do Crato, datados de 1831, ajudam a entender melhor essas teses, fornecendo novos elementos sobre a fundação da Capela de Nossa Senhora das Dores, hoje, igreja matriz de Juazeiro do Norte.

3- Os Livros da Câmara da Vila do Crato

            Na câmara da vila cratense, em seção de 22 de fevereiro de 1831. José Victoriano Maciel (Presidente), Joaquim Ferreira Lima, Roque de Mendonça Barros, José Dias Azedo e Melo e Mariano José Rabelo, remeteram ao vice-presidente da província do Ceará, José de Castro Silva, uma correspondência, na qual tratavam de eleições para o cargo de juiz de paz da vila.
         Na época, a sede das eleições eram os templos religiosos. Daí, ao citarem a povoação de Juazeiro, revelaram que a capela de Nossa Senhora das Dores estava sendo construída e que, enquanto não era finalizada, o capelão praticava seus atos na “casa de oração”:

(...) capela da Senhora das Dores, que se está erigindo distante desta vila três léguas tem capelão encarregado da cura espiritual dos povos daquele distrito, pelo reverendo pároco desta freguesia em uma casa de oração e a grande influência dos povos daquele lugar tem feito com que na capela ereta muito breve se passa celebrar com decência (...).  

            Desta maneira, fica patente que a estrutura da Capela de Nossa Senhora das Dores não se encontrava pronta no ano de 1827, e, no de 1831, ainda estava em processo de construção, sendo que o padre Pedro Ribeiro, proprietário e fundador, nesse período, utilizava uma “casa de oração”, a qual, provavelmente, localizava-se dentro de sua residência ou em lugar próximo.
         Complementarmente, conforme o Doc. 02 (anexo: Correspondência da Câmara do Crato de 17 de março de 1831), a capela de Nossa Senhora das Dores, ainda em construção, era filial da Matriz de Nossa Senhora da Penha do Crato. Logo, presume-se que, se esta capela existisse desde 1827, seria possível encontrar referências aos respectivos atos sacramentais praticados em seu interior nos livros da freguesia de Nossa Senhora da Penha, os quais estão disponibilizados no site dos Mórmons. Mas isso não aconteceu, ou melhor, não se tem notícia de nenhum documento do tipo entre os anos de 1827 a 1830.
         No mais, foi um dos parentes do padre Pedro da Silva Ribeiro, José Geraldo, quem admitiu categoricamente que, na primeira metade de 1831, a Capela de Nossa Senhora das Dores ainda estava sendo erigida (anexo: Doc. 03 ‒ Correspondência de José Geraldo Bezerra de Menezes 24 de março de 1831):  

A Câmara desta vila tomou em consideração um requerimento que a ela foi feito em nome de várias pessoas do sítio das Porteiras [contra elas e o meu e de meus manos?] o coronel Gonçalo Luís Teles de Menezes e o tenente Manuel Leandro Bezerra [mandando-se?] proceder [a] eleição de juiz de paz para a capela de Nossa Senhora das Dores que se está erigindo no sítio do Juazeiro, distante desta vila do Crato três léguas, cujo (...).

            Ora, ao falar que a dita capela ainda “se está erigindo”, José Geraldo assegura que o referido templo não estava completamente construído, e, dessa maneira, não havia sido inaugurado, pois sequer havia sido feita eleição para juiz de paz desta capela. 

4- Testemunho do médico Francisco Freire Alemão

            Entre os anos de 1859 a 1861, dezenas de cientistas brasileiros estiveram perambulando pela então província do Ceará realizando estudos mineralógicos, etnográficos, botânicos, entre outros. Essa empreitada científica, enviada pelo Imperador Dom Pedro II, foi denominada de Comissão Científica de Exploração, à qual a gaiatice cearense rebatizou de Comissão das Borboletas (pelo fato de os cientistas coletarem estes insetos para estudos) ou Comissão Defloradora (em decorrência dos namoros e paqueras entres integrantes desta Comissão e as moças do Ceará).
         Nesse grupo de cientistas, encontrava-se o médico e botânico Francisco Freire Alemão, carioca que foi ao Ceará chefiando a Seção Botânica. O fato é que ele, ao longo dessa viagem, escreveu um diário no qual narra sua passagem por diversas localidades cearenses, incluindo a povoação do Juazeiro.
          Às 7 horas da noite do dia 7 de dezembro de 1859, Alemão, saindo de Missão Velha, entrou na então povoação de Juazeiro do Norte, que, segundo ele, era formada por gente branca e pobre: “como é quase tudo aqui pelo sertão”. Também narra que o vigário, vestindo batina e usando chapéu de dois bicos, foi ao seu encontro.
         Na manhã do dia seguinte, antes de Alemão se dirigir à cidade do Crato, foi se encontrar com o dito vigário na Igreja do Juazeiro, isto é, de Nossa Senhora das Dores. Chegando ao templo, reparou que esta encontrava-se inacabada, com as paredes internas sem reboco:

Levantamo-nos de manhã, vestimo-nos para entrar no Crato, quase no meio da gente da casa e das meninas com suas sainhas (depois do Icó, a maior parte da gente do povo e mesmo algumas senhoras em sua casa andam vestidas de saia, com camisas finas, transparentes, cheias de crivos, entremeios, rendas, babados etc. etc.). Fomos nos despedir do vigário, daí fomos à igreja, que já estava aberta: é grande, mas está ainda por dentro e por fora inteiramente nua, parecendo que nem emboçadas, estão as paredes.[8]          
    
            A pergunta que não quer calar é se a estrutura dessa igreja de Nossa Senhora das Dores, em 1859, era, originalmente, a mesma da época da capela, cuja construção teve início, supostamente, na década de 1827? Ao tempo da passagem de Alemão pelo Juazeiro, a estrutura teria sido modificada por meio de alguma reforma?
         Sabe-se que, em março de 1831, a capela encontrava-se inacabada. Logo, em 1859, no curto lapso temporal de 28 anos, não é crível que tivesse havido reforma significativa no templo mencionado, pois uma edificação desta natureza exigia muito tempo e dinheiro.
         Dessa forma, infere-se que, na segunda metade do século XIX, a capela, depois igreja, de Nossa senhora das Dores já funcionava plenamente, contudo, as obras estruturais ainda não haviam chegado ao fim. Isto não resolve o problema, mas auxilia no melhor entendimento sobre sua arquitetura e engenharia desta edificação sacra.

5- Conclusão

            O assunto concernente à data do início da construção da Capela de Nossa Senhora das Dores não está pacificado, pois existem diferentes indicações, 1827 e 1829, por exemplo. Ao lado disso, há quem afirme que o início das obras coincida com o início de seu funcionamento.
         Para tentar resolver o problema, seria necessário consultar os livros eclesiásticos em Pernambuco, a fim de encontrar algo relativo à licença de construção da capela. Também é oportuno fazer consulta criteriosa nos livros da Freguesia de Nossa Senhora da Penha, de Crato, para conhecer a data, nem que seja aproximada, em que a capela de Nossa Senhora das Dores entrou em funcionamento, batizando, casando, etc.        
         A princípio, pode parecer que o assunto não tenha importância, contudo, estamos falando da primeira capela edificada no território que, hoje, forma a cidade de Juazeiro do Norte, a Meca do Cariri. Tal construção possui importância não apenas por sua primazia, mas, também, por ser protagonista da fé crescente naquela urbe, por ter sido palco do “Milagre de Juazeiro”, bem como por ter emprestado seu nome, durante a guerra civil de 1914, à principal trincheira daquele lugar, o vitorioso “Círculo da Mãe das Dores”.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALEMÃO, Francisco Freire. Diário de Viagem de Francisco Freire Alemão. Fortaleza: Fundação Waldemar Alcântara, 2011.
ARAÚJO, Pe. Antônio Gomes de. Padre Pedro Ribeiro da Silva, O Fundador e Primeiro Capelão de Juazeiro do Norte. Crato-CE: Separata da Revista Itaytera, 1958.
GIRÃO, Raimundo. Os Municípios Cearenses e seus Distritos. Fortaleza: SUDEC, 1983.
MACEDO, Joaryvar. Temas Históricos Regionais. Fortaleza: Secretaria de Cultura e Desporto, 1986.
OLIVEIRA, Amália Xavier de. O Padre Cícero que eu Conheci: Verdadeira História de Juazeiro do Norte. Fortaleza – Ceará: Editora Henriqueta Galeno, 1974.
PINHEIRO, Irineu. Efemérides do Cariri. Fortaleza ‒ CE: Imprensa Universitária, 1963.

DOCUMENTOS:
Arquivo do Instituto Cultural do Cariri (ICC). Jornal Sul do Ceará. Ano V. Número 9. Crato: 16 de abril de 1905.
Arquivo Público do Estado do Ceará – APEC. Fundo: Câmara Municipal. Local: Crato. Data: 1830-1832. Série: Correspondência expedida.

ANEXOS:

Doc. 01: Correspondência da Câmara do Crato de 22 de fevereiro de 1831


Ilustríssimo e Excelentíssimo Vice Presidente
            Tendo o juiz de paz desta vila viajado para Piauí sem requisitar, e nem obter licença alguma, ficando assim paralisado um tão necessário, e melindroso expediente, tratou esta Câmara de proceder eleições na conformidade da lei sem atenção ao ofício de Vossa Excelência de 18 de dezembro de ano pretérito; para suplente do juiz da paz desta mesma vila tem passado ao que obteve a maioria de votos, o que se concluiu no no dia 20 do corrente. Nas mesmas circunstâncias se acha o círculo da povoação da Barbalha por ter se passado para diferente termo o suplente do juiz da dita povoação este ter requisitado, por vezes a esta Câmara, um suplente para substituir, pois se acha em aberto, e atendendo esta Câmara a justa requisição marcou o dia 27 do corrente para se proceder [fl. 01]


            Proceder na mesma capela a eleição com as formalidades da lei. Também participamos a Vossa Excelência que a capela da Senhora das Dores, que se está erigindo distante desta vila três léguas tem capelão encarregado da cura espiritual dos povos daquele distrito, pelo reverendo pároco desta freguesia em uma casa de oração e a grande influência dos povos daquele lugar tem feito com que na capela ereta muito breve se passa celebrar com decência, e sendo presente em Câmara uma requisição de vários cidadãos daquele lugar, e ponderando o quanto convinha ao bem público oração de um juiz de paz na sobredita capela, e convencendo-se esta Câmara da bem justa requisição deliberar que na conformidade das leis sobre este objeto, e Decreto [fl. 02]
            Decreto de 11 de setembro de 1830 se proceda à eleição na segunda dominga dom próximo futuro mês de março, sobre o que Vossa Excelência determinará o que for servido.
            Deus guarde a Vissa Excelência
            Vila do Crato em seção de 22 de fevereiro de 1831.
Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor José de Castro Silva Vice Presidente desta província.
            José Victoriano Maciel. Presidente
            Joaquim Ferreira Lima
            Roque de Mendonça Barros
            José Dias Azedo e Melo
            Mariano José Rabelo  [fl. 02v]    


Doc. 02: Correspondência da Câmara do Crato de 17 de março de 1831


Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Vice Presidente
            Em cumprimento: do ofício de Vossa Excelência de 18 de dezembro de 1830 informamos a Vossa Excelência que existem neste termo três capelas, Santo Antonio da Barbalha. Santana do Brejo Grande, e a capela da Nossa Senhora das Dores do Juazeiro; aquela filial da matriz de São José de Missão Velha, estas filiais desta matriz da Senhora da Penha da vila do Crato: todas tem capelão que administram os sacramentos com autoridade dos párocos: todas tem juiz de paz, a exceção da Capela da Senhora das Dores que no dia 13 do corrente é que foi eleito juiz de paz por ser curada, como já participamos a Vossa Excelência em sessão de 22 de fevereiro do ano corrente.
            Deus guarde.
a Vossa Excelência Vila do Crato em [fl. 01]


sessão de 17 de março de 1831.
IIlustríssimo e Excelentíssio Senhor José de Castro Silva Vice-presidente desta província.
José Victoriano Maciel. Presidente
José Dias Azedo e Melo
Roque de Mendonça Barros
Francisco Pereira Lobo de Menezes
Joaquim Ferreira Lima [fl. 02]


Doc. 03: Correspondência de José Geraldo Bezerra de Menezes 24 de março de 1831



A Câmara desta vila tomou em consideração um requerimento que a ela foi feito em nome de várias pessoas do sítio das Porteiras [contra elas e o meu e de meus manos?] o coronel Gonçalo Luís Teles de Menezes e o tenente Manuel Leandro Bezerra [mandando-se?] proceder [a] eleição de juiz de paz para a capela de Nossa Senhora das Dores que se está erigindo no sítio do Juazeiro, distante desta vila do Crato três léguas, cujo requerimento não foi por nós assinado e nem dele sabemos p.m contudo além desta capela não ser curada para ali se trazer juiz de paz como se vê da certidão junta, conforme dispõe a lei, ainda sim se procedeu a dita eleição no dia 13 de março como se vê da ata e [saí eu eleito?] juiz de paz e meu mano tenente Manuel Leandro Bezerra suplente, como da mesma ata se mostra a vai inclusa, e sendo nós ambos oficiados pela dita Câmara para tomarmos posse foi a mim conferida, e ao meu mano negada e logo fazendo eu requisitar a posse do meu suplente me foi dado um despacho que também remeto a Vossa Excelência já meus [fl. 01]


[incompleto] quiseram dar dita posse nem a ele [e nomeou outrem qualquer?] imediato e porque eu me vejo encarregado nas [palavra ilegível] dos dízimos [incompleto] jornais para meu Rei, e não posso deixar subir às juntas dos gados vacum e cavalar prontamente a Fazenda Pública [incompleto] logo foi por mim protestado embora para que me não fosse criminosa a falta nada digo foi capaz os convencer o que participo a Vossa Excelência para dar as ditas providências
Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor José de Castro Silva Presidente da Província do Ceará
[incompleto] 24 de março de 1831
Deus Guarde Vossa Excelência Sabd.o:
José Geraldo Bezerra de Menezes  [fl. 02]



Doc. 04: Ata de eleição para juiz de paz e suplentes da Capela de N. S. das Dores





(Esses docs foram encontrados por mim no Arquivo Público do Estado do Ceará – APEC. Fundo: Câmara Municipal. Local: Crato. Data: 1830-1832. Série: Correspondência expedida).



[1] GIRÃO, Raimundo. Os Municípios Cearenses e seus Distritos. Fortaleza: SUDEC, 1983, p. 124.
[2] ARAÚJO, Pe. Antônio Gomes de. Padre Pedro Ribeiro da Silva, O Fundador e Primeiro Capelão de Juazeiro do Norte. Crato-CE: Separata da Revista Itaytera, 1958, p. 10.
[3] GIRÃO, Raimundo. Op. cit., p. 124 e 125.
[4] PINHEIRO, Irineu. Efemérides do Cariri. Fortaleza ‒ CE: Imprensa Universitária, 1963, p. 430 e 431.
[5] MACEDO, Joaryvar. Temas Históricos Regionais. Fortaleza: Secretaria de Cultura e Desporto, 1986, p. 106.
[6] OLIVEIRA, Amália Xavier de. O Padre Cícero que eu Conheci: Verdadeira História de Juazeiro do Norte. Fortaleza – Ceará: Editora Henriqueta Galeno, 1974, p. 34.
[7] Arquivo do Instituto Cultural do Cariri (ICC). Jornal Sul do Ceará. Ano V. Número 9. Crato: 16 de abril de 1905, p. 02.
[8] ALEMÃO, Francisco Freire. Diário de Viagem de Francisco Freire Alemão. Fortaleza: Fundação Waldemar Alcântara, 2011, p. 159.

domingo, 3 de novembro de 2019

AS RUÍNAS DO SÍTIO PAU SECO NO JUAZEIRO DO NORTE/CE E A CASA DE BÁRBARA DE ALENCAR


AS RUÍNAS DO SÍTIO PAU SECO NO JUAZEIRO DO NORTE/CE E A CASA DE BÁRBARA DE ALENCAR
                                                                                             
                                                                                Heitor Feitosa Macêdo

         A casa de Bárbara Pereira de Alencar, no sítio Pau Seco, município de Juazeiro do Norte, sul do Estado do Ceará, foi a principal residência rural desta senhora, considerada por muitos como a primeira mulher republicana bem como primeira presa política do Brasil, tendo ela, juntamente com seus filhos, participado diretamente da chamada Revolução Pernambucana de 1817, da Guerra de Independência do Brasil (1822-1823), da Confederação do Equador (1824) e contra a Revolta de Joaquim Pinto Madeira. Além disso, o referido imóvel está inserido em outros contextos históricos de grande relevância para a memória e identidade do povo juazeirense e caririense. 
         Então, por que proteger legalmente este imóvel através de tombamento?
         Este será o nosso escopo nas linhas seguintes!

Ruínas do Engenho no Sítio Pau Seco


1- Origem da Casa do Sítio Pau Seco

            A casa do Sítio Pau Seco foi soerguida às margens do rio “Itaytêra” (do tupi, “ita” = pedra, “y” = água, “era” = velho), o qual, aos ouvidos do branco, passou e ser chamado de “Batatêra” e, no presente, de Salgadinho, tendo suas nascenças no Sítio Luanda (em Crato/CE).
         Este lugar, próximo aos pés da serra do Horto (ou Serra do Catolé, Serra do Cáras, Serra das Cobras e Serra do Salgadinho[1]) serviu de caminho aos invasores brancos no início do século XVIII, quando esta gente, ao cruzar a Cachoeira dos Cariris (em Missão Velha), subia os sertões acompanhando os córregos d’água, até alcançar as nascentes.
         Sabe-se que, em 1703, Manoel Rodrigues Ariosa montou uma fazenda de criar gado no espaço que compreende parte dos atuais territórios de Juazeiro do Norte e Crato, mais especificamente no Sítio São José, que, ao tempo, possuía outras denominações como Lagoa do Ariosa, Lagoa do Cariri e Lagoa do Carité.
         Porém, quando se fala nos mais remotos proprietários brancos do atual território que forma o município de Juazeiro do Norte, é inevitável fazer menção ao coronel, depois brigadeiro, Leandro Bezerra Monteiro, ancestral dos Bezerra de Menezes do Cariri, o qual nasceu no ano de 1740, no Sítio Moquém, município do Crato, tendo seus pais e avós se estabelecido nestas terras nas primeiras décadas do século XVIII[2].
         Por ocasião da morte do seu avô materno, residente em Sergipe, Leandro foi até esta capitania a fim de tratar do recebimento de sua herança, viagem que deu ensejo ao seu casamento com uma prima, no ano de 1764[3]. Ainda, em terras sergipanas, adquiriu o Engenho São José, às margens do Rio Vaza-barris, onde permaneceu até o ano de 1779, quando retornou aos Cariris Novos, sul da capitania do Ceará Grande[4].
         Com a subdivisão das imensas sesmarias, novas fazendas foram surgindo, e, entre os atuais municípios do Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, além do já mencionado Sítio Moquém, também existiu o Sítio Porteiras do Carité, pertencente ao alferes Manoel de Souza Pereira, paraibano, casado com uma irmã do coronel Leandro Bezerra, sendo que este último veio a adquirir o referido Porteiras do Carité através de compra feita aos seus sobrinhos, herdeiros desta sua irmã, no ano de 1780.
         Frise-se que o Sítio Porteiras do Carité também era chamado Porteira de Dentro[5], fazendo parte do desmembramento da primitiva sesmaria de Manoel Rodrigues Ariosa, cuja fazenda era chamada Lagoa do Ariosa, e, antes, repita-se, conhecida por Lagoa do Cariri ou Lagoa do Carité[6]. Cabe também destacar que uma porção desta primitiva sesmaria, englobando grande parte dos três municípios já citados, posteriormente, passou a ser propriedade do coronel Leandro Bezerra Monteiro.
         Leandro viveu por 53 anos neste Sítio Porteiras do Carité, de 1780 até a morte de seu neto, o padre Pedro Ribeiro da Silva (dono e fundador da povoação de Juazeiro do Norte), tendo herdado deste último todos os bens, em razão do que foi morar na casa-grande do Juazeiro, onde faleceu em provecta idade, aos 96 anos, entre os dias 4 e 5 de julho de 1837[7].
         Cabe ressaltar que, entre os séculos XVIII e XIX, além do coronel Leandro Bezerra Monteiro, outras pessoas de ascendência europeia também foram proprietárias de terras na atual área correspondente ao município juazeirense, a exemplo de Bárbara Pereira de Alencar e seus descendentes.

Imagem fictícia de Bárbara Pereira de Alencar

         Segundo um trineto de Bárbara de Alencar, nascido em 1873, na velha casa do Sítio Pau Seco, contava-se que o referido imóvel havia sido por ela comprado a uns frades: “Sempre ouvi dizer que D. Bárbara havia comprado o sitio a UNS FRADES[8].
         O mesmo autor, em publicação datada de 1937, revela detalhes sobre a casa do Pau Seco, a qual, segundo ele, foi reformada, porque, ao tempo de Bárbara, era feita de taipa, e, tempos depois, veio a ser reconstruída com tijolos, porém, conservando-se o quarto desta sua trisavó:

E nesse sitio e na mesma casa, e até no mesmo quarto ou dependencia, em que dormia a heroina, que nasci, em 11 de Fevereiro de 1873. A velha casa da fazenda que ainda conheci muito bem, tendo terreiro velhos pés de joaseiros, que desappareceram e, numa das frentes, uma especie de cêrca de catolezeiros (palmeira) alli plantados, foi reconstruida por um dos herdeiros do meu avô – Manoel da Cruz Rosa Carvalho – o meu tio Antonio Leonidas da Cruz, primo e esposo de minha tia Luisa – Bebé – irmã de meu pae, tambem Manoel da Cruz Rosa Carvalho, filho. A casa foi reconstruída de tijolos (a antiga era de “taipa”, enchimento de madeira) mas, como uma “relíquia”, foi conservado o “quarto de D. Barbara”, com as suas velhas e grossas parêdes, ennegrecidas pelo tempo e que ainda hoje deve existir, tal como era e tal como deixou a sua gloriosa possuidora.[9]     

            Como se pode perceber, a reforma feita na casa do Pau Seco preservou o quarto de Bárbara de Alencar, mantendo-o em taipa, o que, certamente, facilita uma futura prospecção arqueológica in loco, com grande possibilidade de se encontrar nas ruínas alguma estrutura (alicerce) cuja constituição seja de barro com esqueleto de madeira, isto é, de taipa.
Representação artística do Sítio Pau Seco de Oscar Araripe

         Outro fator importante também trazido por José Carvalho diz respeito à origem do nome Pau Seco. Isto porque uma antiga versão dita por seu tio-avô, Antonio da Cruz Neves, afirmava que a tradução da palavra “cariri” era, justamente, “pau seco”, pois, segundo o dito ancião, os índios do território que veio a ser chamado de Cariri habitavam um imenso tronco de árvore morta:

Os indios que João Brigido chama “Cariris” e que viviam em lucta com os “Carius”, chamavam-se, de facto, e segundo a tradição que ora revelo, os PAU SÊCO (...). “Pau-Sêco”, pois, é a “tradução”, em portuguez, do equivalente em “CARIRI” (...). “Minha” tradição, não é propriamente minha. E’ do meu tio-avô Antonio da Cruz Neves, que nasceu, viveu e morreu em Jardim – outro valle do Cariri – e contando mais de cem annos de idade (...). Dizia elle que ouvira dos antigos contar que, no logar, havia uma arvore tão grande, tão colossal, que tendo morrido ou secado, e estando no chão ou derrubada, servia o respectivo ôco ou cavidade do seu tronco de morada e trincheira ao chefe e a toda a tribu senhora da região. Que por isto os taes indios eram conhecidos pelo nome: dos PAU-SÊCO. E dahi vinha tambem o nome do sitio. E’ que tendo esses indios comsigo um escravo, raptado da casa da “Torre”, do São Francisco, (aqui a tradição combina perfeitamente com as outras já conhecidas) e vivendo elles em guerras com os da cachoeira (Missão Velha) esse escravo aconselhou-os a ir pedir o auxilio dos “brancos” da mesma casa da “Torre”.[10]   

            Assim, analisando tal afirmativa, é inevitável pensar que a origem da região do Cariri guarde relação direta com o batismo do referido Sítio Pau Seco, sendo expressões equivalentes nas suas respectivas línguas.
         Além disso, sabe-se que, no ano de 1817, as vilas do Crato e Jardim aderiram à chamada Revolução Pernambucana, a primeira no dia 3 de maio e, a segunda, no dia 5 do mesmo mês, declarando a independência do Cariri em relação a Portugal bem como proclamando a República como nova forma de governo, em substituição à monarquia. Mas o que isso tem a ver com o Juazeiro do Norte e com o Sítio Pau Seco?
         Juazeiro do Norte, até 1911, era território da vila do Crato e, antes da deflagração da dita revolta/revolução, o líder desse movimento no Cariri, José Martiniano de Alencar (futuro senador do Império), ao chegar do Seminário de Olinda/PE, foi direto para a principal residência rural de sua mãe, o Sítio Pau Seco, no dia 29 de abril de 1817.
Senador Alencar (José Martiniano de Alencar)

         Outro dado importante sobre o imóvel a ser tombado diz respeito à narrativa de um viajante inglês, o botânico George Gardner, o qual esteve na vila do Crato em 1838. Este, indo visitar João Gonçalves dos Santos (filho primogênito de Bárbara de Alencar) no Sítio Pau Seco, presenciou o funcionamento de um engenho todo feito de madeira:

Tive muitas ocasiões de ver nesse engenho, como se faz a rapadura. A moagem e o cozimento do suco da cana se processam ao mesmo tempo. O engenho é de construção muito tosca, compondo-se de uma armação com três moendas verticais de pau, entre as quais a cana passa para se expremer o suco que se recolhe num receptor embaixo, donde escorre para um cocho escavado no tronco de grande árvore. Passa-se a cana três vezes para que se extraia toda a garapa. Deste cocho, parte do líquido é levada de tempos em tempos, a pequenos tachos de metal, dos quais havia nove, enfileirados em pequenas aberturas sobre uma fornalha arqueada. Nas diferentes fases do processo, à medida que se faz a evaporação, o suco é despejado de um tacho em outro, até adquirir no último a desejada consistência. Transfere-se então para uma cuba escavada em sólida madeira e que se chama gamela. Aí fica algum tempo a esfriar, sendo então lançado em formas de madeira do formato e tamanho do tijolo comum, embora algumas se façam com a metade deste tamanho. Tiradas das formas, ficam a endurecer ainda por alguns dias e estão prontas para o mercado. As grandes vendem-se em Crato por dois vinténs, em Icó por cinco e em Aracati por quatro. As principais culturas de Crato são a cana-de-açúcar, a mandioca, o arroz e o fumo.[11]    

            Esse relato é um precioso testemunho sobre o funcionamento do engenho de Bárbara de Alencar no Sítio Pau Seco, que ainda possui as antigas ruínas, como os arcos da fornalha, feitos com enormes tijolos e, em alguns pontos, pedra e cal.

Imagem artística de Bárbara de Alencar. Autor: Oscar Araripe

          Outro visitante ilustre que esteve na casa do Pau Seco foi o menino José de Alencar, filho do Senador Alencar e, futuramente, o maior romancista do Brasil, que, enquanto seu pai conversava com o irmão (João Gonçalves de Alencar), ficou a “pastorar” o açúcar que secava ao sol no terreiro, isto para que os animais não metessem o bico na mercadoria:

José Martiniano e o filho, que seria, depois, tão celebre, estiveram, em visita ao irmão e tio, no referido sitio. João Gonçalves presenteou-os com uma porção de assucar – o fino, cristalino e delicioso assucar que dão certos trechos de terrenos d’aquelle brejo – e, precisando seccal-o ao sol, foi o mesmo estendido em um couro de gado no terreiro, como era de costume. Então para BOTAR SENTIDO mandaram o pequeno José, que ficou todo o dia, SENTADINHO em uma cadeira, a enxotar os porcos e demais criações. O regresso de ambos foi feito pelos sertões do Rio São Francisco. Não sei si todos os leitores leram e se recordam de que José de Alencar no seu livro – <<COMO E PORQUE SOU ROMANCISTA>> affirma que a idéia do Guarany lhe germinou no cérebro quando, bem criança, regressára de uma viagem ao Crato, pelo São Francisco. Com que saudades não teria escripto o nosso imortal patricio aquellas linhas, lembrando-se do dia em que no terreiro da casa do Pau-secco BOTÁRA SENTIDO ao couro de assucar, emquanto seu pae, sem duvida, com o resto da familia, falava das grandes cousas do glorioso passado?[12] 

            Ainda, sobre a identificação de pessoas que tenham passado pelo referido sítio, reza Ruth de Alencar que o pai de Dona Bárbara, Joaquim Pereira de Alencar, apesar de ter residido a vida inteira no lado pernambucano da Chapada do Araripe, em Exú, quando velho e doente, foi morar junto da filha, no Pau Seco, onde veio a falecer[13].

Boca da fornalha do engenho do Sítio Pau Seco



2- Da Localização do Sítio Pau Seco: fronteiras do tempo

            A pergunta que não quer calar é, onde fica o Sítio Pau Seco e, mais exatamente, onde se localizam as ruínas que pertenceram à Bárbara Pereira de Alencar?
         A oralidade até hoje encontrada no seio da população que reside no entorno das ruínas da casa e engenho de que tratamos é praticamente uníssona em apontar determinado local como sendo o que restou da casa de Dona Bárbara de Alencar. Impressiona ouvir isto de uma população, na maioria, sem estudo universitário e, alguns, analfabetos. Além do mais, esses mesmos moradores da vizinhança contam histórias sobre botijas, tesouros escondidos, talheres de latão que afloram no solo nas proximidades da ditas ruínas, etc.
         Contudo, alguns estudiosos duvidam que estas sejam, realmente, as ruínas do solar, outrora, habitado por Bárbara de Alencar. Para tanto, este(s) cético(s) se estriba(m) no argumento de que tais ruínas estão encravadas no Sítio Novo Horizonte ou Boca das Cobras, posto que os limites “imaginários” do Sítio Pau Seco estariam a algumas dezenas de metros afastados das referidas ruínas.
         O pesquisador que nos relata essa incongruência acerca da nomeação e localização dos sítios citados, o senhor Erasmo Guimarães (provocado pela senhora Cristina Holanda – historiadora e museóloga), baseia-se em relatos dos atuais moradores bem como em posicionamentos dos marcos das propriedades do padre Cícero Romão Batista:

Interessante pesquisa. Também fiz pesquisa por ali sobre os marcos do padre Cícero no Pau Seco, porém pra muitos moradores o sítio Pau Seco começa da escola de ensino Líder Comunitário e vai até a casa de um dos moradores em que diz ser a primeira do Crato e a última do Juazeiro pela questão divisória no limite imaginário dos moradores da localidade. Da casa para o suposto local de onde foi a residência de Bárbara de Alencar, já não é Pau Seco e sim, Novo Horizonte ou Boca das Cobras como ficou conhecido desde tempos do padre Cícero! Isso implica que o local ou sítio ainda tem muito pra ser explorado (Erasmo Guimarães, publicação na minha página do facebook).

            Levando isto em consideração, passaremos a analisar o problema!     
         O Sítio Pau Seco foi, por muito tempo, administrado pelo filho mais velho de Dona Bárbara, o capitão João Gonçalves de Alencar, o qual, depois da morte de sua mãe, em 1832, além de ter herdado uma pequena gleba neste sítio, também adquiriu outras cotas-partes dos demais herdeiros por meio de compra, conforme se pode ver numa declaração datada de 21 de junho de 1855, extraída dos registros de terras da freguesia do Crato (de 1855 a 1859):

280 Declaro eu João Gonsalves Pereira de Alencar, abaixo assignado; que possuo nesta Freguesia de Nossa Senhora da Penha da Cidade do Crato dusentas e nove braças de terras no Sitio denominado Páo Sêco na beira do rio Batateira; as extremas sao as seguintes; da parte do Nascente extrema com terras do major Semião no mesmo Sitio; da parte do Poente extrema com terras de Gonçallo Ribeiro, tão bem no mesmo Sitio; da parte do Sul extrema com terras do Sitio São Jose com huma legoa de fundos; para o Norte a extremar com fundos de terras do riacho dos Caraes. Declaro mais que no mesmo Sitio Páo Sêco existem dusentas e noventa e oito braças de terras da parte de baixo pertencentes a herdeiros do Sitio, entre as quaes eu possuo seis posses, humas compradas; e outras herdadas, de cujas posses não menciono o numero de braças, por não terem sido medidas; e nem demarcadas; as extremas das mencionadas dusentas  e noventa e oito braças são as seguintes: da parte do Nascente extrema com terras do Sitio Mangueira; da parte do Poente extrema com terras de dona Elena no mesmo Sitio Páo Sêco; da parte do Sul extrema com terras do Sitio Porteiras com huma legoa de fundo; para o Norte a extremar com fundos de terras do riacho dos Caraes. Crato vinte e hum de Junho de mil e oito centos e cincoenta e cinco João Gonsalves Pereira de Alencar [Fl. 60v].[14]

            Segundo o documento, o sítio Pau Seco, em sua totalidade, não pertencia apenas à família Alencar. No mais, este sítio fazia fronteira com o Sítio São José, Riacho dos Carás, Sítio Mangueira e Sítio Porteiras:  

112 Declaro eu, Joaquim José de Macedo abaixo assignado, que possuo nesta Freguesia de Nossa Senhora da Penha do Crato e cento e oitenta braças de terras no Sito denominado – Porteiras -; cujas terras extremão: da parte do Nascente com terras de Ignacio João da Silva no mesmo Sitio; da parte do Poente extrema com terras do Sitio Cabo verde; da parte do Sul extrema com terras do Sitio Salamanca; e da parte do Norte extrema com terras do Sitio Páo Sêco. Crato vinte hum de Agos- [Fl. 24v] Agosto de mil oito centos e cincoenta e cinco Joaquim José de Macedo.      

            Na declaração feita pelo senhor Joaquim José de Macedo, de 21 de agosto de 1855, o Sítio Pau Seco fazia divisa com o seu sítio chamado Porteiras. Segundo Joaryvar Macedo, Porteiras do Carité ou Porteiras de Dentro, em oposição às Porteiras de Fora, que forma o atual município cearense de Porteiras. Outro possuidor de glebas no Sítio Porteiras (o senhor Ignácio João da Silva), também afirma ser confinante com o Sítio Pau Seco:
117 Declaro eu, Ignacio João da Silva abaixo assignado, que possuo nesta Freguesia de Nossa Senhora da Penha do Crato cincoenta braças de terras no Sitio Porteiras, cuja terras extrema da parte do Nascente com terras de João Ignacio da Silva no mesmo Sitio; da parte do Poente extrema com terras de Joaquim José de Macedo tão bem no mesmo Sitio da parte do Sul com terras da Barbalha; e da parte do Norte extrema com terras do Sitio Páo Sêco. Por eu não saber ler, e nem escrever, pedi ao Senhor Benedito José de Oliveira para escrever, e assignar esta minha declaração. Crato tres de Setembro de mil oitocentos e cincoenta e cinco. A pedido do Senhor Ignacio João da Silva escrevi e assignei a presente declaração Benedito José de Oliveira.

            Já Dona Maria Tereza de Jesus, possuidora de terras no lugar denominado de Baixio, afirma que este seu sítio extremava com os sítios Pau Seco, Cobras e com o Riacho Carás:   
282 Declaro eu Theresa de Jesus Maria, abaixo assignada, que possuo nesta Freguesia de Nossa Senhora da Penha huma posse de terras no lugar denominado Bachio; cuja posse extrema: da parte do Nascente com terras do Sitio Páo Sêco; da parte do Poente com terras do Sitio Cobras; da parte do Sul com terras do mesmo Sitio Cobras, e do Estevão; e da parte do Norte com terras de fundos do Riacho dos Carás Crato desenove de Junho de mil e oito centos e cincoenta e seis. Theresa de Jesus Maria

            O bisneto de Dona Bárbara Pereira de Alencar, o senhor José Antão de Carvalho, neto de Dona Carrôla (Joaquina Maria de São José) declarou, no dia 5 de fevereiro de 1857, ser possuidor de terras no Sítio Pau Seco, provavelmente, oriundas do inventário desta sua bisavó:

360 Declaro eu José Antão de Carvalho por meo Procurador Vicente Amancio de Lima abaixo assignado, que possuo huma posse de terras no Sitio Páo Sêco nesta Freguesia de Nossa Senhora da Penha; cujas confrontações são as seguintes: pelo lado do Nascente com terras do Sitio Mangueira de Antonio Machado do Nascimento; pelo Norte com terras de Gonçalo Ribeiro de Aguiar; e pelo Sul com terrras do Sitio Porteiras com os fundos de huma legoa, de Sul a Norte. Cidade do Crato cinco de Fevereiro de mil e oito centos e cincoenta e sete. Vicente Amancio de Lima. [Fl. 80v]   

            Como se percebe, as fronteiras são as mesmas, nos sítios Mangueira e Porteiras. Isso também é repetido na declaração do senhor José Batista da Silveira, que era senhor de uma gleba de terra no Sítio Pau Seco:

440 Eu José Baptista da Silveira abaixo assignado declaro, que sou senhor, e possuidor de hum sitio de terra no lugar Páo Sêco desta Freguesia extremando: ao Nascente com terra de Francisco Leite: ao Poente com terra de João Gonsalves: da parte do Sul com terras das Porteiras: e do Norte huma legoa. Crato dois de Março de mil e oitocentos e cincoenta e sete José Baptista da Silveira [Fl. 99]

         Ao lado disso, o dono do Sítio Mangueira, em março de 1857, assegura que sua propriedade confinava com o Sítio Pau Seco:

493 Declaro eu Antonio Machado do Nascimento, que posso nesta Freguesia do Crato o Sitio Mangueira com tresentas braças de terras de plantações, que que extrema: ao Nascente com o Sitio Logradouro: ao Poente com o Sitio Páo-Sêco: ao Sul com o Sitio Porteiras: e ao Norte com huma legoa de fundos a extremar com terras do riacho Carás. Por não saber escrever, mandei escrever, e assignar esta por meo filho Pedro Machado do Nascimento. Crato de Março de mil e oito centos e cincoenta e sete. Assigno por meo pae Antonio Machado do Nascimento. Pedro Machado do Nascimento. [Fl. 110]

            No dia 22 de março de 1857, o senhor Gonçalo Ribeiro de Aguiar disse ser possuidor de 490 braças de terras no Sítio Pau Seco, sendo que este fazia fronteira com outras áreas do mesmo sítio bem como com o Sítio São José e com o Riacho Carás. É interessante notar que há menção a pedras servindo de marco divisório nas ditas propriedades:
573 Declaro eu Gonçalo Ribeiro de Aguiar abaicho, que possuo nesta Freguesia de Nossa Senhora da Penha do Crato quatro centas e noventa e nove braças de terras no Sitio denominado Páo- Sêco; cujo Sitio extrema: da parte do Nascente com o capitão João Gonsalves Pereira de Alencar em hum marco de pedra; da parte do Poente com o mesmo capitão João Gonsalves em hum marco de pedra; da parte do Norte com huma legoa de fundos a extremar com o riacho de [Fl. 126] Carás; da parte do Sul extrema com os com possuidores do Sitio São José Cidade do Crato em vinte e dois de Março de mil e oito centos e cincoenta e sete. A pedido de meo pai Gonçalo Ribeiro de Aguiar assignei a presente declaração João Ribeiro Reverdosa

            Pelo exposto, é perceptível que o Sítio Pau Seco, até o início da segunda metade do século XIX, não confinava com os sítios chamados Novo Horizonte e Boca das Cobras, conforme acredita o estudioso Erasmo Guimarães.
         Este Sítio Novo Horizonte, ao tempo, talvez sequer existisse com a referida denominação, sendo, posteriormente, simples resultado de dezenas de desmembramentos de propriedades maiores, processo que se observa desde a época das doações sesmariais. Como exemplo, cite-se a sesmaria recebida pelo trisavô do padre Cícero Romão Batista (o tenente José Pereira Aço), nas cabeceiras do Rio ou Riacho Carás, a qual fora, inicialmente, batizada de Corrente e, depois, através de vários desmembramentos, deu origem a diversos sítios/fazendas, como ao Corrente Grande, Correntinho, Monte Alverne, Santa Fé, Cabreiros, Fábrica, etc., de acordo com nosso estudo publicado em "Sertões do Nordeste: Inhamuns e Cariris Novos", 2015, p. 180.
         Ressalte-se também que essas sesmarias eram doadas ao longo do curso dos rios, três léguas de comprimento por uma de largura (meia légua para cada margem), sendo que, em regra, as fronteiras destas fazendas eram demarcadas com pedras, "o principal" (pedra angular, maior) e os dois "testemunhos" (duas pedras menores, postas uma de cada lado da pedra maior). Provavelmente, esta prática chegou ao Cariri a partir de 1702 e 1703, quando o branco invasor efetiva sua posse na área correspondente a este Vale.
         É sabido que o padre Cícero Romão batista nasceu no ano de 1844. Logo, no período dessas declarações de posse era ele apenas um garoto, isto é, ainda não era um milionário, com terras demarcadas por marcos de pedra personalizados.
         Contudo, quando se fala em memória ou história do Juazeiro do Norte, há uma tendência de alguns pesquisadores/historiadores selecionarem apenas episódios que coincidam com a presença do Padre Cícero no lugar. É uma verdadeira “ciceromania”. Isto, provavelmente, é reflexo do fenômeno turístico-religioso que, de certa forma, vem proporcionando ao dito município um crescimento vertiginoso.

Visita às ruínas do Sítio Pau Seco, no dia 02/11/2019. Da esquerda para direita: Roberto Júnior, José Pereira e Heitor Feitosa 

         Juazeiro, também conhecido como a Meca do Nordeste, galgou, entre as décadas de 1960 e 1970, a dianteira econômica da Região do Cariri, tornando-se epicentro comercial, cultural, turístico e educacional de uma vasta região interestadual que engloba vários municípios próximos à Chapada do Araripe (Ceará, Pernambuco, Paraíba e Piauí).
         Este processo de crescimento exponencial da “Nova Roma” tem influenciado diretamente a lavra científica do diversos estudiosos, que, enquanto produto do tempo e do meio, sentem premente necessidade de legitimar uma história hegemônica, nos mesmos moldes, outrora, utilizados pelo município vizinho, o Crato, pois, durante a década de 1950, por meio dos discursos dos intelectuais do Instituto Cultural do Cariri (ICC), tentou-se elevar a urbe cratense ao patamar de centro cultural de toda a região do Cariri, repetindo-se, insistentemente, que a dita cidade seria a "Capital da Cultura".
         Entretanto, voltemos ao tema relativo ao Pau Seco e às ruínas que, supostamente, teriam servido de residência à Dona Bárbara de Alencar. 
       Paralelamente ao que foi retromencionado, encontramos outros elementos que se coadunam com a história oral, ainda viva na localidade. Senão, vejamos!                                 Em depoimento, o atual secretário de cultura do município do Crato (José Wilton da Silva – Dedê) revelou a mim ter encontrado moedas de cobre nas ditas ruínas, sendo que as doou para o museu municipal desta cidade.
         No ano de 2018, em visita ao lugar, juntamente com arqueólogos do Instituto de Arqueologia do Cariri e Fundação Casa Grande, foram identificadas, próximas ao alicerce da antiga casa, diversos fragmentos de louças, possivelmente, fabricadas antes do século XIX. Some-se a isso as afirmativas oriundas dos moradores que me conduziram até a referida localidade, que apontavam terem sido as tais ruínas residência de Dona Bárbara.
         Também coincide com todas essas informações o depoimento do senhor Huberto Cabral Esmeraldo, conhecido memorialista do Crato e "doutor honoris causa" da Universidade Regional do Cariri (URCA), posto que ele também nos indicou as ditas ruínas como sendo a antiga casa e engenho de Bárbara Pereira de Alencar.    

Fragmentos de vidro, com bordos grossos, encontrados nas ruínas
Fragmentos cerâmicos encontrados nas ruínas

                                      
3- Da Necessidade da Pesquisa Arqueológica e Tombamento
           
            Neste instante, vale repetir o que afirmou José Carvalho (trineto de Bárbara Pereira de Alencar) sobre a edificação e constituição da casa do Pau Seco. Segundo ele, o referido imóvel foi reformado, sendo reconstruído em tijolo, contudo, o quarto de Dona Bárbara teria sido mantido em taipa (barro e madeira entrelaçada).
         Logo, basta que os arqueólogos promovam uma escavação nos alicerces das ruínas apontadas pela população como sendo a antiga propriedade da “heroína de 1817”. Daí, encontrando-se um quarto em taipa, poder-se-á dirimir toda a dúvida trazida à baila pelo senhor Erasmo Guimarães. É por este mesmo motivo que já protocolei um requerimento perante a Secretaria de Cultura do Juazeiro do Norte/CE, solicitando estudos arqueológicos.
         Aproveito o ensejo para pedir à senhora Cristina Holanda o apoio nessa atividade, já que é gestora do Museu Padre Cícero e especialista em Arqueologia Social Inclusiva.   
         Destaque-se que as ruínas do engenho e da casa em que, supostamente, residiu Bárbara Pereira de Alencar, no Sítio Pau Seco, na zona rural do Juazeiro do Norte/CE, correm o risco de desaparecer em decorrência do avanço da zona urbana e da especulação imobiliária.
         Estas ruínas são das mais antigas de todo o Cariri cearense e remetem a diversos personagens históricos da região, a exemplo de Bárbara Pereira de Alencar; seu filho, o senador José Martiniano de Alencar; o filho deste último, o escritor José de Alencar; o médico inglês George Gardner; o escritor José Carvalho, que fez parte do movimento literário chamado de Padaria Espiritual, entre outros.
         Consequentemente, a história do referido imóvel guarda estreita relação com o Estado Moderno, com o constitucionalismo, com a forma de governo republicana, com as ideais liberais que, em seu bojo, traziam grande influência cristã (liberdade, igualdade e fraternidade), posto que estamos falando de uma parte do município do Juazeiro do Norte, a Meca do Nordeste, a Terra Prometida, a Vapabuçú da mitologia indígena.    
         Efetuando-se o tombamento destas ruínas, além de garantir a memória e identidade histórica regional, também se estará fomentando o turismo e, com isso, a geração de renda para a população.
         Mas não para por aí! Esse tombamento também carrega o potencial de mitigar a rivalidade ainda existente entre a população do Crato e a do Juazeiro do Norte, surgida desde a emancipação desta última e agudizada pela guerra civil de 1914. A história e a cultura desse mesmo povo se entrelaça e não há razão de que esse apartheide continue a subsistir, principalmente nas mentes obsoletas das almas que não conseguem se desvencilhar do ódio sepultado com seus avós.
         Esse antagonismo latente tem prejudicado de diversas maneiras não só o desenvolvimento socioeconômico mas, também, as narrativas históricas, posto que vários escritores tendem a escamotear toda e qualquer memória que diga respeito ao município rival. Às vezes, alguns pretendem que a História do Juazeiro não seja História do Crato e vice-versa.
         Porém, afirmo que a História do Juazeiro não começou com o Padre Cícero Romão Batista, seu grande benfeitor, bem como a História do Crato não deve se restringir as suas atuais fronteiras, excluindo a bela trajetória dos romeiros. As cidades-estados se fadaram com a antiga civilização grega e não há razão de que isso permaneça entre nós, aqui no Cariri.
         Logo, as ruínas do Sítio Peu Seco são um dos elos históricos que unem Crato e Juazeiro do Norte em episódios de luta ideológica, por princípios dirigidos ao bem coletivo.  


4- Da Análise Jurídica sobre a Proteção Legal

            O artigo 216 da Constituição Federal do Brasil, de 1988, trata do tombamento nos seguintes termos:

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
§ 1º O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.

            Já a lei municipal do Juazeiro do Norte/CE, nº 2.121, de 23 de agosto de 1996, em seu artigo 4º, determina que o tombamento se dará por meio de decreto do Chefe do Poder Executivo:

Art. 4º - Esta lei será regulamentada através de Decreto que tombará outros documentos, obras e bens de valor histórico, artístico e cultural, os documentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos, os imóveis que tenham influência na história do Município de Juazeiro do Norte e do Padre Cícero Romão Batista.

            Neste ponto, cabe ressaltar que o Padre Cícero Romão Batista pertencia ao clã familiar chamado de “As Quatro Sergipanas”, podendo-se destacar neste grupo o sobrenome Ferreira Lima, parentes do Padre Cícero.
         Ocorre que a história da família Alencar se liga aos Ferreira Lima desde o final do século XVIII e início do século XIX, pois Tristão Gonçalves de Alencar Araripe, filho de Bárbara de Alencar, foi casado com uma prima do Padre Cícero, Ana Porcina Ferreira Lima, mais conhecida por Ana Triste, após o marido ter sido morto brutalmente durante a Confederação do Equador[15].
         Além disso, é importante frisar que, no ato de julgamento de Joaquim Pinto Madeira, quando este foi vítima da manipulação do Poder Judiciário pelos Alencar e os Ferreira Lima (ambos liberais e republicanos), dois dos avós do Padre Cícero fizeram parte do corpo de jurados, mesmo que suspeitos e impedidos, condenando o réu à pena última:
O segundo dos cinco jurados, José Romão Batista (ou Romão José Batista), também conhecido por capitão Romão (avô paterno do futuro padre Cícero Romão Batista[16]), havia lutado sempre ao lado dos liberais, e, consequentemente, dos Alencar. O capitão Romão era tio-avô do referido Antônio Ferreira Lima Sucupira[17], e, por isso, estava impedido e suspeito pelas mesmas circunstâncias já citadas.  O terceiro dos cinco jurados era Raimundo Pedroso Batista, sobrinho do capitão José Romão Batista[18], e, pelo exposto, também encontrava-se impedido e/ou suspeito de fazer parte do Conselho de Sentença no julgamento de Pinto Madeira. O quarto dos cinco jurados impedidos e/ou suspeitos era o baiano da Cachoeira, José Ferreira Castão, que também estava ligado ao clã das Quatro Sergipanas, pois sua filha Joaquina Ferreira Castão (mãe do futuro padre Cícero Romão Batista) foi casada com Joaquim Romão Batista (Mirabô ou Mirabeau), o qual, por sua vez, era filho do já citado capitão Romão[19]. Também deve ser ressaltado que o irmão de José Ferreira Castão, Januário Ferreira Castão, era casado com uma irmã do juiz, presidente do Tribunal do Júri, José Vitoriano Maciel[20].[21]

            Como se percebe, o objeto desta análise jurídica atende aos requisitos de tombamento patrimonial da referida lei municipal. Mas, antes, deve ser submetido a estudos arqueológicos mais aprofundados, in loco.

À direita, Heitor Feitosa, em visita às ruínas do Sítio Pau Seco, no ano de 2015


5- Conclusão

            O argumento do pesquisador Erasmo Guimarães é válido para estimular a discussão a respeito desse patrimônio material, tirando-o do esquecimento em que repousa. Por outro lado, o argumento aduzido, de que o Pau Seco se restringiria uma pequenina nesga de terra, lindeira ao atual sítio Novo Horizonte ou, por outro nome, Boca da Mata, não possui embasamento histórico, conforme examinamos no registro de terras da Freguesia do Crato, de 1855 a 1859.
         Portanto, as ruínas aqui mencionadas devem ser objeto de estudos arqueológicos e, caso seja comprovada a existência do quarto feito em taipa (pertencente a Dona Bárbara pereira de Alencar), deve o Poder Público municipal, ou quem de direito, promover o tombamento do equipamento, a fim de preservar a memória regional e fomentar também o turismo não religioso, cumprindo os mandamentos da Constituição Federal de 1988.    






REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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Para o estudo da história da Revolução de 1817 (Coleção T. Araripe), In: Revista do Instituto do Ceará, Ano XXXIII, Fortaleza – Ceará, 1919.
Registro de Terras da Freguesia do Crato - 1855 a 1859, paleografado por Liduina Queiroz de Vasconcelos - Paleógrafa/APEC (Arquivo Público do Estado do Ceará), Fortaleza, 03 de fevereiro de 2010.

                       
           




[1] LÓSSIO, Moacyr Gondim. Geografia do Crato. Revista Hyhyté. Nº 07. Crato – Ceará: Faculdade de Filosofia do Crato, maio de 1980, p. 16.
[2] Sobre a parentela e a aquisição da propriedade de Leandro Bezerra, disse José Denizard Macêdo de Alcântara: “Filho do sergipano Capitão Antonio Pinheiro Lobo e Mendonça e da pernambucana Joana Bezerra de Menezes, nasceu a 5 de dezembro de 1740, no Engenho Moquem, no município do Crato (...) é de presumir que Perpétua Caetana era irmã imediata na sequência familiar. Consorciada com o paraibano Alferes Manoel de Souza Pereira (fls. 45, Livro de Registro de 1748-1764, da Paróquia de Missão Velha), foram proprietários do Sítio ‘Porteiras’, revendido pelos herdeiros ao irmão, o então Sargento-mor Leandro Bezerra Monteiro, em 1780 (Livro de Notas do 1º Cartório do Crato, 1770-1785)” (ROCHA FILHO. J. Dias da. Vida do Brigadeiro Leandro Bezerra Monteiro. 2ª Ed., Fortaleza ‒ CE: Secretaria de Cultura, Desporto e Promoção Social, 1978, p. 15 e 16). Sobre o avô do Brigadeiro Leandro Bezerra, observa Rocha Filho: “Seu avô materno, o coronel João Bezerra Monteiro, fora o primitivo dono dessa propriedade, para a qual se passara da fazenda Zoroés, que possuía nas imediações do Icó” (Ibidem, p. 39). Ver também: ARAÚJO, Padre Antônio Gomes de. Povoamento do Cariri. Op. cit., p. 95.
[3] ROCHA FILHO. Op. cit., p. 40.
[4] Ibidem, p. 41.
[5] Joaryvar Macedo fala sobre estes nomes e os respectivos desmembramentos: “... nas do Miranda, a cidade do Crato; nas das Porteiras do Padre Valério, (também conhecidas como Porteiras de Fora, para distinguir das Porteiras de Dentro que eram as mesmas Porteiras do Carité) a cidade de Porteiras...” (MACÊDO, Joaryvar. Povoamento e Povoadores do Cariri Cearense. Fortaleza: Secretaria de Cultura e Desporto, 1985, p. 36). Ainda, sobre o mesmo tema, o autor explica que: “Lagoa do Ariosa – No lugar deste nome, em cujas terras, existe hoje o Sítio São José, entre Crato e Juazeiro do Norte, na segunda metade do Século XVIII residiu e foi proprietário o Alferes Manuel de Souza Pereira, paraibano, filho do português lisboeta Antônio de Sousa Pereira e Maria da Silva Correia, paraibana de Taquara. O referido Alferes, que senhoreou, por igual, o Sítio Porteiras do Carité, no mesmo setor, onde também residiu, foi casado com a caririense Caetana Perpétua do Nascimento Bezerra de Menezes, filha do sergipano Capitão Antônio Pinheiro Lôbo de Mendonça e de Joana Bezerra Monteiro ou Joana Bezerra de Menezes, pernambucana de Jaboatão” (Ibidem, p. 46).
[6] O Rio mais caldaloso do Cariri é o Salgado, o qual tem suas nascentes na base da Chapada do Araripe e assim é denominado a partir da Cachoeira de Missão Velha. Nos antigos registros, o Rio Salgado aparece com outras denominações, como Carité e, também, Rio Podre, por conta das inundações ocorridas no ano de 1766 em diante. Por último, acrescente-se que outra antiga referência ao Rio Salgado era a de Jaguaribe-mirim (BEZERRA. Op. cit., p. 87, 109, 126, 159 e 165). Joaryvar Macedo assegura que o Rio Carité era a antiga denominação para o Rio Salgadinho, sendo o mesmo que banha o município do Crato com o nome de Batateira (MACEDO, Joaryvar. Temas Históricos e Regionais. Fortaleza: Secretaria de Cultura e Desporto, 1986, p. 102).
[7] ROCHA FILHO. Op. cit., p. 19.
[8] CARVALHO, José. Mais uma tradição sobre a descoberta do Cariri: O Sitio Pau-Seco, no Crato, Ceará. Revista do Instituto do Ceará. Fortaleza: Typographia Gadelha, 1931, p. 113.
[9] Ibidem, p. 113.
[10] Ib., p. 111 a 117.
[11] GARDNER, George. Viagem ao Interior do Brasil: principalmente nas províncias do Norte e nos distritos do ouro e do diamante durante os anos de 1836-1841. São Paulo: Editora da Universidade do São Paulo, 1975, p. 95.
[12] CARVALHO, José. Heroina Nacional. Barbara de Alencar. Fortaleza: Revista do Instituto do Ceará, 1920, 208.
[13] LEÃO, Ruth de Alencar et alii. Mulheres do Brasil. 1º Volume. Fortaleza: Editora Henriqueta Galeno, 1971, p. 189 e 190.
[14] Registro de Terras da Freguesia do Crato - 1855 a 1859, paleografado por Liduina Queiroz de Vasconcelos - Paleógrafa/APEC (Arquivo Público do Estado do Ceará), Fortaleza, 03 de fevereiro de 2010, fl. 60v.
[15] MACÊDO, Heitor Feitosa. Sertões do Nordeste: Inhamuns e Cariris Novos, Volume I. Crato: A Província, 2015, p. 157.
[16] MACÊDO, Heitor Feitosa. Sertões do Nordeste: Inhamuns e Cariris Novos, Volume I. Op. cit., p. 164.
[17] O capitão Romão José Batista era irmão de Maria da Conceição Batista, mãe de Josefa de Jesus Batista, e esta, por sua vez, mãe de Antônio Ferreira Lima Sucupira (MONTENEGRO, Padre F. Op. cit., p. 28 e 29).
[18] Raimundo Pedroso Batista também descendia das quatro irmãs sergipanas, sendo filho do português Domingos Pedroso Batista e Teresa de Jesus Batista, a qual era filha do casal Francisca Pereira de Oliveira e do portugês tenente-coronel Antônio José Batista e Melo. Francisca era filha do tenente José Pereira Aço e Apolônia Correia de Oliveira, uma das quatro sergipanas (ARAÚJO, Padre Antônio Gomes de. Raízes Sergipanas.  Revista Itaytera, Ano III, Nº III, Crato/CE: Instituto Cultural do Cariri, 1957, p. 10).
[19] MACÊDO, Heitor Feitosa. Sertões do Nordeste. Op. cit., p. 164 e 171.
[20] ARAÚJO. Povoamento do Cariri. Op. cit., p., p. 81 e 105.
[21] MACÊDO, Heitor Feitosa. O Assassinato do Primeiro Tribunal do Júri no Cariri, em 1834. Monografia (URCA). Espacialização em Criminologia e Direito Penal. 2018, p. 174 e 175.